quinta-feira, 7 de outubro de 2010

A INFÂNCIA DO ZÉ MUNDÃO

O Zé nasceu em Manaus, na Santa Casa de Misericórdia, foi direto para a sua nova residência na “Cidade Flutuante”, não foi muito chegado ao leite materno, desde novinho foi criado à base de “Mingau de Banana Verde”, “Araruta” e “Cremogema”, depois, a sua dieta passou a ser direto o peixe; por ser um pobre ribeirinho, não tinha acesso aos produtos industrializados, tudo era natural, fez também a “dieta da sopa”, ou seja, deu sopa ele comia, não fazia cerimônia, comia feito uma draga.

Pegou aquelas doenças comuns da sua época, como a “Papeira”, “Catapora” e “Sarampo”, criou bastantes lombrigas no bucho, pegou muita “Frieira e Mijacão”; as suas doenças eram curadas com a “Mamona”, “Jalapa Pião”, “Copaíba”, “Chá de limão com Melhoral”, “Xarope Caseiro” e pegou muita surra para tomar “Magnésia”.

Por morar num flutuante, teve de aprender a nadar bem cedo, na sua residência não tinha água encanada e nem luz, bebia água de “Pote” e tomava banhos no igarapé e nas cacimbas, a casa era iluminada com “Lamparinas e Candeeiros”; o café era torrado e pilado em casa, a comida era feita num “Fogão a Lenha” e tinha poucos móveis, apesar de todas as dificuldades materiais, era um caboquinho feliz, cresceu forte e sadio e, começou a aprontar desde cedo.

Os seus brinquedos eram feitos manualmente por seu pai, um exímio marceneiro, certa vez, ganhou de presente da sua madrinha um “Globo Terrestre”, passava horas e horas girando a esfera, parava e ficava apontando o dedo: - Quando eu crescer vou viajar e conhecer a França, Itália, Japão, Portugal, Alemanha e a América, aliás, quero conhecer o mundo todo! Foi um passo para o apelidarem de “Zé Mundão”.

Ele era o responsável em esperar o “Padeiro” e o “Leiteiro” na rua, certa vez, deixou o pão e o leite escondidos e foi pegar “Mangas” e “Biribás” no terreno do “Dural”; quando voltou alguém tinham comido o “bico do pão” e um gato derrubou a leiteira e estava lambendo o leite, a bronca ia ser alta pro Zé, mas, ele era um cara esperto, espantou o bichano e pensou: - Vou completar o litro de leite com água, não quero nem provar, está cheio de pelos do gato, vou ver se o velho engole essa! Dito e feito, o Zé tomou o “café puro” e ainda teve que explicar que foi ele quem comeu o “bico do pão”, depois de algum tempo, falou do ocorrido para o seu irmão mais velho e foi dedurado, pegou uma surra daquelas e ainda ficou um mês de castigo!

O Zé tinha uma vizinha que falava o tempo todo palavrões, aprendeu rapidinho todo o vocabulário, pegou muito “tapa na boca” para perder aquele costume feio, mas, aquele “sinal com o dedo” ele não deixou de mostrar para as pessoas que o acomodava, gritava assim - Tá qui prá ti!

Estudava no Barão do Rio Branco, a sua avó o matriculou no primeiro ano, mas o Zé não sabia ler nem escrever, a primeira tarefa na escola era fazer uma cópia, na malandragem, pediu ao seu colega "Nascimento", para fazer a cópia, o cara era canhoto, pegou o caderno do Zé Mundão e mandou ver. o Zé foi entregar o trabaho, todo satisfeito:  Fessora Genevova, tai a cópia, tá bonita? - Vá fazer outra cópia, você fez com o caderno de cabeça para baixo! - dando aquele ralho. Não se conteve, chorou que nem um bezerro desmamado, a professora descobriu  que ele estava na série errada e o encaminhou para a “Alfa”; cobrir as letras foi uma graça para Zé Mundão; o que ele mais odiava era o “hora da merenda”, não trazia nada de casa e tinha que encarar aquele “leite de soja” que era enviado ao Brasil pelos norte-americanos, o jeito era “filar” a merenda dos meninos do “pré-escolar”, certa vez, foi pego e levado pela “orelha” até a Diretoria, os seus pais foram chamados à atenção - moral da historia: ganhou uma “Lancheira” novinha em folha, com direito a suco de “Maracujá” e Sanduíche de “Pão com Pão”, a partir dai, começou a adorar a hora de merenda e gostava de deixar os seus colegas com água na boca, nunca mais tomou o famoso "leite de posto"!.

Tempo depois, saiu do “flutuante” e vou morar com a família numa “casa de madeira”, fora proibido de tomar banho no igarapé, não tinha jeito, tirava o calção, colocava num arbusto qualquer e pulava dentro d’água, ninguém usava cuecas naquela época, certa vez, o seu “amigo da onça” o famoso “Nego Mau”, escondeu a roupa do Zé Mundão, o coitado passou a tarde toda dentro do rio, deixou a noite chegar e correu “pelado, pelado, nu com a mão no bolso”, passou pela rua até chegar à sua casa, foi gozado por bastante tempo, mas o cara sabe muito bem dar o troco: - Vou dá um tempo, vou pegar o escroto do “Nego Mau” e todos os amigos deles que ficaram me gozando!

Num belo sábado à tarde, estava o “Nego Mau” e toda a sua galera tomando banho pelado no rio, o Zé foi de mansinho e pegou os calções de todos eles, quando estava bem distante, gritou: - Ei, ei, Negou Mau, olha aqui, estou com o teu calção e da tua galera, quero ver todo mundo pelado, sai da água se tu é macho, sai! Foi um Deus nos acuda, prometeram uma bela sova no Zé, mas, ele não estava nem ai! À noite, toda a molecada estava na beira do rio, esperando a galera sair da água, não deu outra, todo mundo correndo pelado pela rua, a gozação foi total. O Zé ficou uma semana sem sair da sua casa, somente ia à escola, escoltado pelos seus pais, mas, um dia pegaram o Zé Mundão, deram a prometida surra nele e ainda tiraram o calção dele, teve que correr novamente pelado pela rua até chegar a sua casa!

O Zé curtiu todas as brincadeiras que as criançadas de Manaus curtiam naquele tempo: Soltar Papagaio de Papel, Pião, Cangapé, Boi de Pano, Caroço de Tucumã, Macaca, Manja, Cemitério, Barbandeira e Jogo de bolinha de gude. Além desses, gostava de pular da “Ponte Romana”, escalar os muros dos vizinhos para pegar “Mangas”, morcegar “Carroças” e assistir filmes de bang-bang no Cine Guarany. Ele aprontava muito, ficava a maioria das vezes de castigo, mas, fugia para brincar na rua, não tinha jeito – “sapeca no Zé!”.


O Zé Mundão era um grande “perna-de-pau”, jogava uma bola “quadrada”, tanto que era sempre escalado para ficar no gol, além de “brabo” era também um goleiro “frangueiro” – passou uns seis meses vendendo picolés, bolinhas de gudes, revistas de quadrinhos e fazendo mandado para os outros, tudo para comprar uma” Bola Oficial”, num belo dia, chega no “Campinho da Várzea” todo “gabola”, com a bola embaixo do braço e mandou ver: - A partir de hoje quem manda no time sou seu, o Nego Mau vai para o gol e eu vou para o ataque, quem “frescar” vai para o banco, se não estiverem de acordo, levo a bola, tudo bem? Todos respondiam: - Sim, Zé Mundão, você é o dono da bola! E assim foi por uma semana, pois a bola caiu num quintal de um velho ranzinza e a cortou em vários pedaços, acabou o reinado do Zé e ele voltou novamente para o gol!


O Zé tinha mania de subir em árvores, certa vez, subiu num pé de “Açaizeiro”, deu uma ventania, e ele ficou a balançar prá lá e prá cá, pensou que ia cair e morrer, depois da calmaria, jurou que nunca mais ia subir em árvores, no dia seguinte, já estava escalando uma grande “Mangueira”, quando estava no “olho” o seu velho começou a gritar: - Desce daí, Zé Mundão, a tua cama ta feita, vais pegar uma surra dobrada! Não tinha jeito, subia no Abacateiro e peia, Jenipapeiro, Ingazeiro, Coqueiro e peia!

A infância do Zé Mundão foi assim, já dava para vislumbrar a peça rara que ele seria. Eu, hein, Zé Mundão!





Nota do Blog - O Zé Mundão é um personagem criado pelo blog – um cabocão manauense, ambientalista, gozador, enrolado até o cabelo, amante da cidade de Manaus, curtidor da vida social, cultural e etílica da sua cidade. Alguns leitores assíduos do blog gostam das peripécias do Zé Mundão, inclusive, confundem com a pessoa do editor do blogdorocha, mas não tem nada a ver, tudo é uma mistura do passado, com a realidade e ficção da vida de um típico manauense.


















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