O
Zé Mundão virou vovô, a sua filha do meio fez uma “carreira solo”, ficou prenhe e teve uma
filha do boto (mãe sem marido), mas, ser pai da mãe, ou seja, pai duas vezes
foi uma coisa maravilhosa que aconteceu com ele.
Ele
não leva nenhum jeito dos avôs de antigamente, pois pertence aquele grupo de
senhores de meia idade que pintam os cabelos, fazem manicure e pedicuro, tomam
a famosa “azulzinha” para ajudar na “hora agá”, fazem academias e caminhadas,
utilizam as parafernálias eletrônicas de ponta e usam as mídias sociais e se
vestem igualzinho aos filhos mais novos.
Muitos
casam ou se amancebam novamente, geralmente, procuram mulheres mais novas e,
pasmem, ainda fazem filhos!
O
Zé Mundão foi passear na praça com a família e encontra um velho amigo e inicia
o bate-papo:
- E ai Bepi, essa é a tua filha?
- Não, ela é a minha
mulher!
- Desculpe, então, esse
curumim ai é teu filho?
- Não, ele é o meu netinho
mais novo!
- E essa guriazinha, é
também tua netinha?
- Não, ela é minha filha
mais nova!
- E você, Zé Mundão?
- Tudo na normalidade,
essa aqui é a minha filha e a netinha, estou solteiro novamente, tô na área do
gol, se aparecer uma gatinha de bobeira, é pênalti!
- Beleza, Zé Mundão! Qual
é a sensação para você ser avô?
- Estou adorando, gosto de
pegar pelas mãos da minha netinha, passear nas praças e shoppings, brincar nas
praias, jogar bola e pedalar bicicleta – voltei a ser menino também!
O tempo
passa, o tempo voa, as pessoas passam e, envelhecem - o nosso Zé Mundão também
entrou nessa fase, porém continuava na ativa, trabalhando por conta própria,
pois estava fora do mercado de trabalho em decorrência da sua idade, no
entanto, não pensava nem um pouco em se aposentar - apesar de todas as
peripécias que fez na vida maluca que levou desde a sua tenra idade, sempre foi
uma pessoa que deu muito duro para colaborar no sustento da sua família,
incluindo os netos.
Apesar de
gostar imensamente do trabalho, ele sabe que daqui mais uns anos as forças
cessarão e, terá que parar de qualquer maneira com a labuta – para tanto, começou
a fazer visitas ao Asilo Dr. Thomas,
para conhecer a futura moradia, pois apesar de possuir família, tem o desejo de
morar um dia junto com os outros velhinhos, assim como vez um dia o seu pai.
Num sábado quente de Manaus, foi até o Bar do Armando, no Largo de São Sebastião, para tomar uma gelada e saborear um sanduíche de pernil, fez amizade com uma senhora, a cantora Sasá, moradora do Asilo, ela estava
acompanhado do poeta e escritor Áureo, conhecido como Bucheiro, também morador do mesmo abrigo - estavam divulgando o CD
da artista – fizeram um belo show no boteco, com direito a muito “Aluá” (bebida fermentada da casca do
abacaxi) e pupunhas à vontade.
Duas vezes ao mês, sempre as sábados, o Zé Mundão
visitava os dois no abrigo de velhinhos – eles sempre estavam juntos, eram tipo
“unha e carne” - passavam à tarde falando
sobre suas vidas, pois eram bastante descontraídos e falantes e, lembravam com
detalhes sobre o passado.
O Zé Mundão gostou tanto da história dos dois que,
resolveu escrever e torná-la público nas redes sociais.
A Sasá foi batizada Maria
Salete, nasceu no Rio Grande do Norte, na cidade de Cruzeta, setentona, com quase
vinte anos morando na Fundação Doutor Thomas, possui deficiência visual, mesmo
assim, destaca-se como uma excelente compositora e cantora, além de possuir um
invejável alto astral.
Foi casada duas vezes,
sendo mãe de seis filhos; veio para Manaus aos 35 anos idade, perdeu a visão
aos 51 anos de idade e, entrou no Asilo com apenas 57 anos.
Depois que perdeu o
sentido da vista, o seu dom musical veio aflorar, compôs inúmeras músicas,
sendo as mais conhecidas: “Telefone” (foi gentilmente doada ao cantor pop-brega
Nunes Bregão) e "Seringueiro" (fala da época áurea da borracha e dos
trabalhos dos seringueiros).
Gravou dois CD`s, o
primeiro foi “A Luz dos Meus Olhos”, com dez faixas de sua própria autoria; o
segundo, foi dedicado às criancinhas de Manaus, chama-se “Canções Infantis da
Vovó Sasá”, com destaque para “Coelhinho”, “Parabéns” e “Pinóquio”.
Além desse dom musical,
ela esbanja alegria, felicidade e alto astral, sendo eleitas várias vezes a
rainha do carnaval da Fundação Doutor Thomas, além de ser sempre lembrada e homenageada
no “Dia Internacional da Mulher”.
Encontrou o seu segundo
amor na própria instituição onde mora, o seu casamento foi realizado
na Fundação, com direito a um belo vestido branco de noiva e tudo o mais,
o evento foi filmado e passado numa televisão de Manaus, infelizmente, o seu
marido veio a falecer pouco tempo depois. Para compensar a solidão, ficou amiga
inseparável do poeta Bucheiro.
O Bucheiro nasceu em
Manaus, no bairro de São Raimundo, na década de 20, foram cinquenta anos de muita
produção artística, dedicada ao Brasil e a sua querida cidade natal - militou
no jornalismo, foi também um escritor consagrado, além de poeta e compositor.
Ainda muito jovem, com
apenas dezessete anos de idade, embarcou no navio “Prudente de Moraes” com
destino ao Rio de Janeiro, como voluntário do Exército Brasileiro, ficou no 14º
Regimento de Infantaria do 1º Exército, sediado em São Gonçalo - passou cinquenta
anos no eixo Rio-SP, chegando a receber, o título de cidadão do Estado do Rio
de Janeiro.
Ao se aposentar,
resolveu viver os últimos anos da sua vida na sua amada Manaus – tinha
condições financeiras para viver muito bem obrigado, mas, contrariando a
família, foi morar no “Asilo Doutor Thomas”.
No abrigo em que morava
voluntariamente, tinha toda a liberdade para entrar e sair, no horário que bem
entendesse – por ser um boêmio inveterado, gostava da noite, era um notívago
como todo bom poeta, adorava festas, era um exímio “pé-de-valsa”; contar causos
era com ele mesmo, era muito bom de papo, mas, não gostava de ser contrariado,
esquentava a cabeça facilmente – curtiu muito bem os seus últimos anos da sua
vida nos botecos tracionais de Manaus.
Deu um belo presente
para a sua cidade com a música “Canção de Manaus”:
Que viu você
Não pode mais esquecer
Quem vê você,
Logo começa a querer;
Manaus, Manaus, Manaus
Minha cidade querida.
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