quarta-feira, 18 de março de 2009

PERSONAGENS DE MANAUS: COCOTA E LAMEGO

O jornalista Orlando Farias, juntamente com o Mário Adolfo, Simão Pessoa e Marcos Gomes, publicaram o livro “Amor de Bica”, no ano de 2005, editado pelo Coletivo Gens da Selva, com o apoio da Secretaria de Cultura do Amazonas. Nas páginas 24, 25 e 26, comentam sobre duas figuras da cidade de Manaus: Cocota e Lamego. O título é bastante sugestivo: “Dois Fenômenos, Duas Lendas”, é mais ou menos assim:

(... A BICA respira mesmo ares muito civilizado. Dois casos são clássicos e reveladores da oxigenação do ambiente. O ex-fora da lei Euler Silva, o popular “Cocota”, e o policial Lamego, que se fez acompanhar durante muito tempo pela suspeita de matador e maligno.

Cocota é uma lenda da Praça São Sebastião (hoje Largo) e de seus arredores, tendo se envolvido com tráfico de drogas e outros pequenos ilícitos. Lamego foi objeto de muitas reportagens citado sempre como exterminador. A acusação ele sempre rechaçou “ - Na verdade, fui apenas duro no cumprimento da lei e no combate permanente com os bandidos”, ressalva hoje.

Lamego admite que deve muito a BICA e aos estudos, aos quais resolveu se debruçar após 30 anos, pela superação definitiva daquele triste drama. “Na BICA, eu me purifiquei bebendo na experiência de vida de muitos amigos”, conta Lamego. Diz que aprendeu boas doses de humanismo, de ética e de democracia. “Hoje eu sou muito mais ponderado, crítico e devoto uma importância grande aos estudos”, diz.

Lamego continua investigador de ponta da Policia Civil, mas tem um grande orgulho na vida, conseguiu concluir um curso superior e ser Psicólogo, profissão que já começa a exercer, ao mesmo tempo em que vai levando adiante os estudos de pós-graduação.

Cocota, por sua vez, aprontou tudo o que tinha direito. Foi morar na rua protegido por uma companhia lendária – a de uma cadela, cujo maior feito foi tê-lo esperado dois meses à porta do presídio Raimundo Vidal Pessoa. No dia em que de lá saiu, dois meses após um flagrante por levar consigo algumas trouxinhas de maconha, lá estava a cadela à sua espera.

Cocota jamais foi um homem perigoso à sociedade. Na verdade, naufragou sob o impacto das ondas ditadas pelas mazelas sociais e do banzeiro da mediocridade das estruturas do Estado, que não lhe permitiram, em detrimento da vida, ser um simples vagabundo.

A história de Cocota foi muito bem ilustrada pelo jornalista Inácio Oliveira, biqueiro, numa reportagem no jornal Amazonas em Tempo e legou um título inesquecível: “Admirável Vagabundo”. Mais recentemente, no ano de 2003, Cocota foi motivo novamente de uma reportagem levada a efeito pela assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça do Amazonas. Ele foi identificado com um dos muitos casos de pessoas que não viraram reféns do crime, após entrar em seus subterrâneos e deles sair intacto.

Cocota foi se retirando dos submundos pela ação assistencial da igreja capuchinha de frei Fulgêncio Monacelli e com a ajuda de muitos biqueiros, com destaque para o psiquiatra Rogelio Casado e o delegado aposentado Trindade.

Reabilitado socialmente, sem dever nada à Justiça ou à sociedade, Cocota cumpre uma missão pra lá de louvável a qualquer ser vivente que habite esse planetinha azul tão açoitado por impactos das guerras, das revoluções industriais e tecnológicas que se sucedem e das devastadoras perdas impostas pela exploração criminosa das matérias-primas. Cocota coordena no Paricatuba (margem direita do rio Negro, em frente da cidade de Manaus) um projeto de reprodução de mudas nativas da Amazônia para reflorestar áreas degradadas da floresta...)

É isso ai, a história desses dois amigos é prá lá de interessante; o Lamego continua estudando, agora é acadêmico de Direito, futuramente será um Delegado de Polícia. O Cocota continua nas suas idas e vindas de Paricatuba; lá é hóspede cativo do Paulo Mamulengo, aqui em Manaus prefere ficar dormindo na Rua Marcílio Dias, em frente a Casa do Trabalhador! Continua sendo o nosso eterno admirável vagabundo.