quinta-feira, 20 de março de 2008

JARAQUI FRITO COM BAIÃO DE DOIS




Estamos na semana santa e, como manda a tradição católica, nada de carne vermelha; a alimentação indicada é o peixe.

O Bacalhau somente para os mais abastados; o nosso Pirarucu nem com “nojo de pitiú de Bodó!” Está caríssimo. A solução será o Semaprochilodus brama; calma não é coisa do outro mundo! É o nome cientifico do queridíssimo Jaraqui – “Jaraca” para os íntimos. O Pacu (ou Paboca) assado e a Sardinha estão também de bom tamanho para o meu bolso furado.

Fui ao templo do peixe, o Restaurante Galo Carijó, situado na esquina da Rua dos Andradas com a Rua Pedro Botelho, centro antigo de Manaus. O estabelecimento estava lotado, assim mesmo fiz logo o meu pedido: Jaraqui frito com os acessórios (baião de dois, farinha ova, tucupi, pimenta murupi, limão, sal e azeite de oliva). Fiquei na espera de uma mesa, um olho no peixe e outro no Felis cattus domesticus (se bobear o gato leva!).

Assumi a primeira mesa que desocupou, fiquei naquele martírio, esperando o meu manjar. Dois senhores se aproximaram e pediram para sentar à mesa, concordei gentilmente; começaram a falar sobre negócios, com sotaque de nordestino, o papo envolvia muita grana nas transações; tinha que ouvir aqueles indivíduos fanfarrões.

A garçonete veio ao meu encontro e perguntou: Eles estão com você? O pedido também é Jaraqui? Antes de responder que não, um deles foi logo detonando: Não gosto desse peixe, amazonense é que come isso ai (com ar de desprezo), quero um Tucunaré bem grande. Fiquei engasgado entes de o jaraca chegar; pensei com os meus botões – dou uma dura nesses palhaços ou me mudo de mesa? Optei pela segunda opção.

O meu peixe estava saboroso, enquanto comia olhava para o cearense, notei que ele estava envergonhado da declaração infeliz; talvez o Tucunaré estivesse entrando quadrado; quem sabe na próxima vez irá fazer o seguinte pedido: Um Jaraca com baião de dois, por favor! Não sou amazonense, mas comi o jaraqui e não saio mais daqui, nem com nojo!

quarta-feira, 19 de março de 2008

COLEGAS AMAZONENSES REUNIDOS NO CALDEIRA BAR

 
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Milton Hatoum encara o desafio da novela em “Órfãos do Eldorado”



18/03 - 09:39 - Jonas Lopes e Luciana Araujo
SÃO PAULO – "Cada livro te ensina como escrevê-lo", diz o escritor Milton Hatoum nesta conversa sobre sua mais nova obra. "Órfãos do Eldorado" (Companhia das Letras) é um caso em que o tal aprendizado, entre tantos outros típicos de qualquer produção artística, se deu principalmente pelo desafio imposto pelo gênero. Romancista premiado, Hatoum fala ao Último Segundo sobre a dificuldade enfrentada ao aceitar a empreitada de enquadrar um de seus projetos nas regras da "Coleção Mitos", idealizada pela editora escocesa Canongate e publicada por um pool de editoras em 30 países.
Você diz que hoje em dia não reconhece mais a sua cidade, Manaus. Agora comenta que São Paulo é uma cidade diferente, mas a Manaus dos seus livros não é uma Manaus memorialística, uma Manaus cheia de lacunas assim como as narrativas dos seus livros?

É a minha Manaus. Uma vez conheci uma leitora que disse que foi a Manaus para encontrar “Dois irmãos” e não encontrou. Mas muitas pessoas disseram que sentiram o ambiente: o cheiro, as pessoas, o porto. No “Cinzas” já há uma Manaus do anos 1970, que expressa a primeira grande devastação urbana na periferia da cidade. Uma Manaus pós-Zona Franca. O Borges dizia que é mais verossímil falar de alguma coisa muito longe no tempo e no espaço, porque ninguém pode verificar se é verdade (risos). A Vila Bela do “Órfãos” foi inspirada em Parintins. Um dos nomes de Parintins no passado foi Vila Bela da Rainha. Eu conheci Parintins ainda jovem, voltei outras vezes e ao escrever o “Órfãos” voltei duas vezes, viajei de barco, andei pela cidade, localizei a fazenda Boa Vida. Isso quando eu já tinha avançado bastante no livro. As pessoas de Parintins vão perceber a inspiração quando lerem. A rampa do mercado, a praça do Sagrado Coração, que é a mesma, o Convento das Carmelitas, que está lá. Descobri o nome Dinaura em Parintins. Encontrei uma moça com um carrinho, perguntei o nome dela. Eu achei lindo. Já tinha uma personagem feminina, mas eu procurava o nome. Encontrei nessa moça. E a Manaus de 1900 até a Segunda Guerra eu conheço pelas fotografias, pelos livros, pelas histórias que meu pai e meu avô me contavam. Minha infância se passou numa Manaus intacta, que não tinha um edifício. Era uma cidade só com sobrados e bairros. Eu conhecia essa Manaus pré-destruição, antes das fábricas. Agora ela tem dois milhões de habitantes e eu não a reconheço.

domingo, 16 de março de 2008

BAR DO BOI EM MANAUS



Hoje é sábado, dia de brincadeira de boi! Parece coisa da nossa infância, mas não é!

Começou a temporada bovina no Centro de Convenções em Manaus (complexo desportivo-cultural).

Esta festa consiste na apresentação dos levantadores (cantores), apresentando toadas (músicas) dos anos anteriores e os lançamentos para 2008, além dos itens oficiais para a nova temporada: pajé, cunhã-poranga, sinhazinha da fazenda, boi de pano, tribos indígenas, novos bailados (passos da dança),batucada e marujada de guerra, torcidas organizadas, etc.

O objetivo maior é a arrecadação de recursos para a apresentação dos bois na cidade de Parintins (município do baixo Amazonas).

Os bois caprichoso (azul e branco) e garantido (vermelho e branco) revezam aos sábados, apresentando a cada semana um show temático, levando uma multidão às suas apresentações.

Freqüento os currais faz quinze anos; comecei no clube da TVLANDIA (hoje é um grande centro de compras), mas a cada final de semana sinto uma emoção inigualável. As minhas duas filhas adoram e o velho aqui também!

Conheço várias pessoas, a maioria considerada “intelectual”, possuidora de um ódio mortal dessa manifestação popular; os argumentos são diversos - alegam a carnavalização do evento, uso indevido da cultura indígena, alem da não representação fiel da nossa cultura.

Respeito a opinião de todos, mas não embarco nesta onda, aliás embarco mesmo é para Parintins. A viagem é uma oportunidade impar de apreciar as inúmeras belezas da nossa Amazônia, comer bodó com tucupi, passear de quadriciculo, conhecer irmãos caboclos, dormir na rede e assistir ao espetáculo grandioso na arena do Bumbodromo.

ESCOLA RURAL - VAMOS CUIDAR COM MAIS RESPEITO AS NOSSAS CRIANCAS!

sexta-feira, 7 de março de 2008

COISAS DE AMAZONENSE

Elisa Luchini


Primeiramente, você tem que treinar falar com as pessoas pegando nelas. 
No braço, no ombro, no cotovelo. Mas tem de pegar. A linguagem corporal é tão importante para o amazonense, quanto o descanso o é para o baiano e a desconfiança para o mineiro. 

Beijinhos de cumprimento são sempre dois. Os paulistas têm de aumentar um e os gaúchos têm de reduzir um. Isso pode causar uma série de beijos órfãos no ar para aqueles que estão em fase de adaptação. O pegar e o beijinho do amazonense não devem ser entendidos, grosso modo, como invasivos, mas como parte mesmo de sua enunciação, parte do sentido do dizer. 

Outra coisa: amazonense aponta com a boca. Pergunte a um amazonense onde está algo e ele, muito provavelmente, em vez de levantar a mão e apontar,fará um biquinho em direção à coisa procurada. Aliás, um biquinho não, um beicinho. “É bem aliiiiii!!!” 

Amazonense é solidário. Muito. Pergunte e ele responderá. 
Peça e ele lhe ajudará. Dê trela e ele grudará. 
O amazonense é muito caloroso. Não só pelo calor que faz em Manaus, mas porque facilmente puxa papo e se integra a um grupo. Basta uma possibilidade de entrada na conversa e..zapt! estamos dentro, na maior intimidade. Isso pode causar certo choque para as pessoas do sul e sudeste, mais reservadas no assunto amizade. É mais difícil "aprochegar-se" em São Paulo do que em Manaus, definitivamente. Mas há doces exceções. 

Há ainda a questão da língua. Algumas palavras e expressões que realmente levam algum tempinho para que sejam dominadas e internalizadas. Seguem abaixo algumas palavras e expressões típicas com suas explicações e comentários. 


ÉGUA - Égua pode ser usado em várias situações. 
Alguém faz algo que você não entendeu: "égua..." 
Uma situação estapafúrdia? "Éééguaa, maninho..." 

QUE SÓ - Locução adverbial de intensidade, similar a "pra caramba". Hoje está quente que só". "Ela é lesa que só". "A sala estava lotada que só" 

LESO (A), LESEIRA - Um leso é alguém que sofre de leseira. Leseira é um abestalhamento momentâneo que acomete o leso. Se a leseira for uma característica contínua, dizemos que o leso sofre de leseira baré. 
Segundo cientistas da Universidade de Kuala Lumpur, a leseira baré ocorre entre os amazonenses devido ao sol quente na moleira, que frita o cérebro e queima alguns neurônios. Temos ainda as expressões derivadas: "Deixa de ser leso!" e "Pára de leseira!". Mas como tudo tem seus dois lados, dizem que o sol também causa nos amazonense algo chamado tesão de mormaço. Auto-explicativo. 

AGORINHA - Diferentemente do uso no sudeste, agorinha quer dizer "há alguns segundos", referindo-se ao passado e não ao futuro. "Ela estava aqui agorinha, mas sumiu". 

MANO(A) - Tratamento carinhoso entre conhecidos ou não. Muito usado para fazer perguntas e pedidos. "Mana, faz um favor pra mim". "E aí, tudo bem, mano?" 

MANINHO(A) - Tratamento não carinhoso usado por pessoas que já estão estressadas "maninho, tu não tem o que fazer não?" 

TELESÉ - é a mesma coisa que "tu é leso é?" 

PITIÚ - Cheiro. Geralmente associado a peixe "Tá sentindo um pitiú danado aqui?" 

BORIMBORA - Vamos embora. "A gente não tem mais nada a fazer aqui.Borimbora!" 

MAS QUANDO? - ( quer dizer que nunca, nem pensar ) - " Ele disse pra eu ir lá na casa dele.. mas quando. 

MACETA - Grande, imenso, de proporções anormais. "Eu disse que ia lá brigar com ele e quando eu olhei o cara era maaaaaaaaaaceta. Saí fora..." 

CARAPANÃ - Pernilongo. Só que mais chato e mais chupador. 
Termo indígena para "lança voadora", segundo a lenda urbana. 

MAIS VOU MERMO - Indica uma afirmativa veemente . "Vamos a Ponta Negra no domingo? Resposta: Mais vou mermo". Ainda pode ser usada uma variação MAIS QUERO MERMO, "Ta afim de um sorvete de creme de cupuaçu? 
Resposta: Mais quero mermo". (Obs.: Uma verdadeira Manauara nunca rejeita um sorvete de cupuaçu ou tapioca) 

NEM COM NOJO - Indica uma negativa veemente. "Não empresto dinheiro para ele nem com nojo", "Vai ter que comer este peixe hoje, sem farinha amarela e sem pimenta. Reposta: Nem com nojo". 

MÁ RAPÁZ - O mesmo que "Olha já!". "Me empresta teu carro?" "Má rapá!Claro que não!"

Colaboração da professora de Língua Portuguesa Elisa Luchini