sábado, 30 de abril de 2011

O NEGO MAU, DO IGARAPÉ DE MANAUS.

O Nego Mau é um grande amigo meu, moramos no Igarapé de Manaus, fomos moleque de rua, conheço essa figura como a palma da minha mão; pela alcunha que o marcou até hoje, dá para se ter uma ideia o quanto o bonitinho aprontava, o cara era realmente um malvado, travesso e traquina, era o capeta em pessoa, pense numa figura escrota. Pensou? Pois é, mano velho, assim era o Nego Mau. O cara aprontou poucas e boas, ele era esperto, revelou bem cedo o seu lado empreendedor; para ganhar dinheiro em cima dos otários, montou nos porões da sua casa o “Matinê do Nego Mau”, passava filmes em caixinhas de sapato, cobrava o ingresso da molecada, aproveitava para ganhar mais algum, vendendo KSuco de Uva com bolacha da Padaria Modelo, certa vez, resolveu majorar os preços, com a ânsia de faturar mais alto, tomou no fiofó, um concorrente abriu outro Cine, com mais conforto e com os preços dos ingressos bem abaixo da concorrência, o Nego Mau foi à falência, mas, o capeta não se deixava abater, partiu logo para outro empreendimento, montou no mesmo local o “Circo do Nego Mau”, fez o cenário, figurino, treinou a molecada, formou palhaços, malabaristas e trapezistas, fui um deles, cai na lábia do safado do Nego Mau, ele tinha prometido que no final da temporada, todos os brincantes iriam receber o seu cachê, falou que era bem melhor ele guardar o nosso dinheiro e receber a “bolada” no final do ano, o dinheiro daria para comprar uma bicicleta “Monareta” novinha em folha, era o nosso sonho infantil de consumo. Era tudo brincadeira de criança, mas, o pilantra do Nego Mau levava à sério, foram seis meses trabalhando todos os finais de semana, o porão sempre ficava cheio de expectadores mirins, com o bonitinho faturando na bilheteria; quando chegou Dezembro, o “fio duma égua” deu uma pernada na molecada, chorou miséria, era um artista, sabia representar muito bem, apressentou uma “contabilidade” fajuta, demonstrou na maior cara-de-pau que os gastos foram maiores do que a receita, - moral da história: prejuízo, nada de babita e a Monareta ficou para o próximo ano! Na temporada do ano seguinte o negócio foi diferente, colocamos o Nego Mau contra parede, ele tinha que pagar no final de cada apresentação, mas, o bonitinho embolsava a metade da grana dos ingressos e enganava a turma. Ele era o único filho homem da família, o queridinho da mamãe, mimado pela Dona Nira, ela botava tudo na boquinha do safado. Andava sempre bem trajado, perfumado, com talquinho no pescoço, era bem alimentado e ganhava brinquedos caros, já era metido à besta desde novinho, não compartilhava nada com os colegas de rua, gostava mesmo era de se mostrar e tirar saro da cara dos outros. Ele sempre foi o melhor nas brincadeiras de rua, ganhava sempre na “bolinha”, na dama, no cangapé e no peão, pense num sortudo e esperto, assim era o Nego Mau. No futebol, ele era um era um tremendo “perna de pau”, mas, era o dono da bola, me escalava sempre para ficar no gol, o bonitinho gostava da “banheira”, o negócio dele era receber a bola, chutar e correr para o abraço. Quando ficou mais taludinho, começou a brechar a mulherada tomando banho, o que lhe rendeu muitos calos na mão direita, gostava também de colocar a “piroca” dentro de uma garrafa, certa vez, a “bicha” ficou rígida e não saia mais nem com nojo, o cara entrou em pânico e saiu correndo pela rua, um moleque deu uma martelada, foi caco de garrafa e de falo para todos os lados; o safado do Nego Mau ficou envergonhado e se enclausurou em casa por dois meses, não aguentava mais ser chamado de “Nego Mau, o pomba de vidro”. Ele tinha um amigo chamado Pingo Bringel, um filinho de papai que gostava também de aprontar, os dois de vez e quanto se estranhavam; num belo dia, o Pingo ficou escondido nos altos do “Solar dos Bringel” e botou para mijar na cabeça da molecada do Igarapé de Manaus, o Nego Mau ao passar pelo local tomou um banho, jurou que iria matar o Pingo de porrada. Sabe como é: quem bate, esquece! Um dia, o Pingo apareceu na rua com a maior cara dura, o Nego Mau foi o primeira a correr atrás dele, o cara caiu dentro de um buraco, sem chance para o Pingo, o Nego jogou uma pedra de barro na cabeça do Pingo, ele simplesmente desmaiou, foi um corre-corre da família, ai o bicho pegou, o Nego Mau correu para a sua casa, entrou de mansinho pelos fundos, tomou um banho e se meteu embaixo dos lençóis e começou a roncar, fingindo que estava dormindo. Levaram o Pingo ao Pronto-Socorro, foi medicado e voltou para casa, depois, a família do Pingo foi até a casa do capetinha, chegando lá, a Dona Nira saiu em defesa do filho, falando que o Nego era uma criança incapaz de fazer aquilo, pois era bondoso e colega de todos da rua e, além do mais, ele passou à tarde toda dormindo, um álibi perfeito. Um santo do pau oco. O tempo passa, o tempo voa! Três décadas depois, reuniram-se os colegas de infância, o Nego Mau, Rocha Filho, Henrique e o Neno, foram jantar no Restaurante Gato Preto, no bairro da Cachoeirinha, tomaram duas grandes de cervejas, comeram dois galetos e vários tira-gostos de carne com cebola, a conta deu mais de trezentos paus, três deles se combinaram e um mandou ver: - Nego Mau, filho da puta, tu vais pagar a conta sozinho, não esquecemos que você roubou a gente no Circo! Deixaram o Nego Mau falando sozinho e foram assistir a um show no Nostalgia Clube. O Nego Mau tornou-se um executivo, ganhou dinheiro no Distrito Industrial, teve um AVC e se aposentou, mas, continua com a cara de mau, cabelos grisalhos, com um bigode de “rodapé de priquito”, ainda gosta de andar na beca, todo arrumadinho, cheirosinho e escrotinho, adora tirar onda no Bar Jangadeiro, centro antigo de Manaus e no ET Bar, do Boulevard, dizem que ele ainda detona a “Loura”. Será? Quando está prá lá de Bagdá, fica encarando todo mundo e mandando ver: - Bota prá cima otário! Pega aqui na minha periquitinha, pega! Esse é o nosso querido amigo Nego Mau, apesar das poucas e boas que ele aprontou, todos os amigos de infância admiram muito ele, pela lealdade e a amizade que ele sempre demonstrou a todos os colegas do Igarapé de Manaus. É isso.