O nosso saudoso poeta/compositor Aníbal Beça, assim cantava: “Hoje é domingo na Vila de São José da Barra...”. Hoje é dia de missa na Matriz, tomar banho no Igarapé de Manaus, assistir aos filmes no cinema Guarany e brincar de Papagaio de Papel. Acorda José! O tempo já passou!
Para matar a saudade, dei um pulo lá pelas bandas dos Educandos (1), encontrei uma simpática vendedora de papagaios de papel, tirei algumas fotos, comprei umas carapetas (2) e dei para a molecada brincarem, foi uma festa! Outro lugar visitado foi em frente aos barracões das escolas de samba de Manaus, entre o Sambodrómo e a Vila Olímpica, o local é amplo, a fiação elétrica é interna, o lugar é ideal para a prática da brincadeira de papagaios de papel.
Na década de 60, existia em Manaus um sujeito chamado pelo cognome de Russo, era exímio “fabricante” de Papagaio de Papel, além da melhor maçaroca (3) de cerol (4) do pedaço. O preço era bastante salgado, mas era o melhor da cidade, não era penso (5) e, dava para trançar (6) e cortar na mão (7). Quem não tinha a verba (8), era o meu caso, o jeito era se virar nos trinta, ou seja, conseguir uma vara bem grande e correr atrás dos papagaios que eram cortados.
O meus pais não permitiam eu participar dessa brincadeira, pois ela é muito perigosa, o risco de ser acidentado é muito grande, o cerol é um perigo, mas, sabe como é moleque, bastava eles virarem as costas para eu correr para a rua e começar a empinar o meu papagaio. Ficávamos de um olho nos papagaios e o outro nos fiscais da CEM (9); quem fosse pego na brincadeira, ficava sem os papagaios e as linhas, se o caboclo (10) partisse para a grosseria, era colocado na Manduquinha (11) e levado para a Delegacia de Polícia da Joaquim Nabuco.
É mano velho, o tempo passou, vou tirar da estante aquele CD comprado do Leandro Grande Circular (12), e ouvir o compositor parintinense Chico da Silva detonando “Tempo Bom”: Naquele tempo de menino, ainda tenho no meu peito muita saudade, roda pião, estilingue no pescoço e papagaio pra soltar...”.
Para entender o linguajar (dialeto) da molecada de Manaus:
(1) Educandos – bairro da zona sul de Manaus;
(2) Carapeta – papagaios de tamanho P;
(3) Maçaroca – linha no. 40, enrolada na tala da folha de buritizeiro;
(4) Cerol - mistura de cola de madeira e vidro moído que as crianças passam na linha dos papagaios para cortar as de outrem;
(5) Penso – ficava inclinado para esquerda ou direita – o famoso “cangula”;
(6) Trançar – entrelaçar dois papagaios, o melhor cortava a linha do outro;
(7) Cortar na mão – cortar o papagaio do outro com bastante linha;
(8) Verba - dinheiro, money, carvão, faz-me rir, gaita, grana, jabaculê, tostão, etc.
(9) CEM - Companhia de Eletricidade de Manaus - apelidada de “Sem Energia”, atual Manaus Energia;
(10) Caboco - caboclo, mestiço de branco e índio;
(11) Manduqinha (AM) – carro da polícia para o transporte de pessoas detidas. (MA) carinhosa, (MG) carrocinha, (RJ, desus.) tintureiro e (RJ SP.) viúva-alegre;
(12) Grade Circular - linha de ônibus para a Zona Leste (o lugar mais longínquo do centro de Manaus); o Leandro é um conhecido vendedor de discos em Manaus, anda a pé por toda a cidade, dizem que quando for inaugurada a ponte para Iranduba, mudará o nome para Leandro Região Metropolitana de Manaus.
PAPAGAIO DE PAPEL: A ORIGEM DO BRINQUEDO - www.uems.br/cellms/documentos
Brincadeira antiga e conhecida em todo o mundo, o papagaio de papel tem indícios do seu surgimento entre os séculos XIII ou XIV na China. Segundo Cascudo (1999, p. 477), a princípio, quando do seu surgimento, o papagaio de papel não possuía função lúdica. Foi utilizado pelo general chinês Han-Sin para enviar notícias a uma praça sitiada. Por intervenção portuguesa o papagaio de papel se estendeu por toda Europa, depois foi trazido para América. O brinquedo serviu até como fonte de experiência científica, já que, em 1752, Benjamim Franklin utilizou o brinquedo para uma experimentação meteorológica (ALENCAR, 1971).Esse brinquedo tem inspirado trabalhos em muitas áreas, pois pintores, azulejistas, músicos, escritores, poetas, caricaturistas, compositores encontram no brinquedo a inspiração para suas obras.O papagaio foi adquirindo novas formas com o passar do tempo – alguns ainda são feitos de papel, muitos de pano, plástico, nylon, conforme a criatividade permitir, já que o comércio possui uma variedade de material para a confecção desse tipo de brinquedo. Outra forma de divertimento com esse brinquedo é a de “passar telegrama” pelo fio do papagaio de papel, brincadeira em que rodelas de papel são postas no fio do papagaio e assim vão “andando” a centenas de metros de altura. Nos Estados Unidos existe, inclusive, uma Associação Internacional de Empinadores de Papagaios.No Brasil, o papagaio de papel chegou com dos portugueses, e até hoje fascina crianças e adultos. Embora muitas referências apontem os meninos como principais usuários desse brinquedo, muitas meninas também entram na maravilhosa diversão de empinar os papagaios de papel.A pipa é, enfim, um brinquedo conhecido entre em Portugal, como estrela, raia, arraia, papagaio, bacalhau, gaivota, e no Brasil como papagaio, curica, pipa, cafifa, pandorga, arraia, quadrado, raia, pepeta, rabiola, dentre outras. Isso demonstra a manutenção de formas lusas no português do Brasil, na nomeação do brinquedo em pauta: papagaio, arraia e raia.
2 comentários:
Caro amigo, esse post tá demais, parabéns.muito legal a descrição da brincadeira de papagaio de papel.
Rocha teu blog tá show! Toda semana leio os posts!
Rocha, sabe de alguma imagem do avião da praça da saudade como nós o víamos na época? A única que conheço é aquela p/b aérea, ruinzinha. Me referi àquele avião no meu livro "Nivi" mas baseei o "local" só por lembranças mesmo.
É verdade que a frente do tal avião é aquele que está na parede daquela empresa de táxi aéreo do aeroclube? Será?
Abração e continue com o ÓTIMO trabalho!
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