Existe canoa de todas as formas
e tamanhos, porém, sem a quilha, o caboco pode remar, remar e remar, mesmo
assim, apesar de todo o esforço empregado, não sairá do lugar onde está, ficará
dando voltas e mais voltas em torno de si mesmo – sem esse pequeno leme fixo,
que é colocado na parte inferior traseira dessa pequena embarcação, a pessoa
ficará estacionada, da mesma forma quando não se tem objetivos firmes na vida –
muitas pessoas (faço parte desse grupo) em alguns momentos afirmam ”a
minha canoa não tem quilha nenhum, remei muito e, não cheguei a lugar algum!
Pois é mano velho, irei
comentar um pouco sobre a canoa, a quilha, dos objetivos na vida e das remadas
que não levam a lugar nenhum.
A nossa Amazônia é um
mundo de águas, onde as estradas são os rios, com os barcos substituindo os
carros – a canoa possui um significado todo especial para o amazônida (filho, descendente
ou natural da Amazônia), por ser uma embarcação barata, serve em muito para o
caboclo vencer pequenas distâncias.
A noção de espaço na nossa
terra é diferente de outras plagas, em decorrência da imensidão do nosso Estado.
Quando um caboclo diz “Vu bem acolá”, pode ter certeza que ele vai dar longas
remadas de ida e volta – na cidade, as distâncias são marcadas pelos quilômetros
marcados pelos automóveis, no interior, o ribeirinho o faz por horas de
braçadas no cabo de um remo.
Num belo domingo, o caboclo resolve passear com a família: – Minha véia, arruma os troços e a curuminzada, vamos até a casa do cumpadre Marcão, na Costa do Marecão, serão duas horas de canua para chegar e duas para vortar!
A canoa é um patrimônio cultural que está sendo ameaçada de extinção, com a madeira sendo substituída paulatinamente pela fibra e alumínio e, o remo dando lugar ao motor de popa e de rabeta, perdendo, dessa forma, as tradições e conhecimentos milenares consubstanciado em cada barco regional.
As canoas não são mais construídas
a partir de um tronco de uma árvore frondosa (herança dos nossos ancestrais indígenas).
Alcançam em média uns 15 metros de comprimento, composta de cavername (conjunto
das peças que dão forma ao casco da embarcação: quilha, roda-de-proa, cadaste,
cavernas, longarinas, escoras, etc.) e costado (revestimento ou forro
exterior), contando ainda com proa (detrás), cabina baixa, mastro curto,
carangueija, retranca e, popa (parte da frente).
Para a canoa que desliza, calma e velozmente, quando a vibração do ar sopra na sua parte posterior (proa) e quando vai tudo bem na vida e nos negócios, faz sentido aquela frase “Ir de vento em popa”.
Para a canoa que desliza, calma e velozmente, quando a vibração do ar sopra na sua parte posterior (proa) e quando vai tudo bem na vida e nos negócios, faz sentido aquela frase “Ir de vento em popa”.
Todas essas peças são
importantes, mas, a danada da quilha faz toda a diferença, sem esse pequeno
pedaço de madeira – já era, meu irmão! Lembro-me da minha adolescência, quando gostava
de pescar entre as boias (toras de madeiras) de uma serraria do bairro da
Aparecida (acho que era a Serraria Mathias).
Certa vez, aluguei uma
canoa velha, fiquei pescando numa boa, de repetente, começam a se soltar as toras
que estavam amaradas no fundo do rio, foi um sufoco total, pois um tronco da
madeira bateu exatamente na quilha, danificando-a. Dezenas de outros troncos estavam
boiando, passante rente a minha canoa, caso uma batesse ao meio, o estrago
seria total.
Acho que dei centenas de RPM
- remadas por minuto -, mas, não saia do lugar, quanto mais braçadas dava no
remo, mais a canoa rodava, o jeito foi pular dentro do rio, nadar entre as
toras que boiavam a toda instante – abandonei os peixes, os apetrechos de pescaria e, a canoa velha sem quilha!
Penso que a minha vida continuou
sendo uma eterna canoa sem quilha, pois estudei muito, feito um maluco beleza;
fiz e conclui a duras penas a faculdade de estudos sociais; parei de estudar inglês
e amazonês; tranquei o curso de Direito; fiz inúmeros concursos para ingressar
na Administração Pública e, nada! Trabalhei durante muitos anos em assessoria
em comércio exterior (prestador de serviços), sem direito a férias, décimo-terceiro,
FGTS e o PL (o famoso “Pega Leso”, aquela “mereca” que os patrões dão aos seus colaboradores,
como forma de participação nos lucros da empresa).
Remei, remei, remei sem
parar, sem nunca ter saído do mesmo lugar. A minha sina será sempre como a velha
canoa sem quilha? Acho que não, chega de desatino vou consertá-la, colocar
um calafeto novo, adquirir um remo e, chegar ao meu destino!
É isso ai, canoa sem quilha. Eu, hein!
Foto: J Martins Rocha (Canoa na Vila de Paricatuba)
2 comentários:
Quem diria ... Usando uma canoa eu receberia essa bela lição ... Muito bom ... Aprendi sobre a vida e sobre a canoa ao mesmo tempo ...
Que é isso, companheiro? Você não é burro, nem, corrupto, nem autoritário. Qual é, mano?
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