domingo, 23 de janeiro de 2011

BAR DO ARMANDO


O Bar do Armando, fica localizado na Rua Dez de Julho, perto da Igreja de São Sebastião, do Teatro Amazonas, do Palácio de Justiça e da Santa Casa de Misericórdia, perto de tudo. 

Certa vez, um poeta maluco, frequentador assíduo do Bar, escreveu “Do meu Bar vejo o Mundo”, outro doido, sentado numa mesa do Bar, falou o seguinte: - No interior, a lua cheia nasce atrás do bananal, aqui, na cidade, ela nasce atrás do Taj Mahal! Referindo-se a um imponente hotel que fica na Avenida Getúlio Vargas e dando os fundos para o Largo de São Sebastião. 

Na minha juventude, passava por lá para comprar algum gênero alimentício, pois ali já fora um comércio de secos e molhados.

O dono do estabelecimento é o casal português Armando Soares e Dona Lourdes Soeiro, sendo o primeiro, somente sorrisos e brincadeiras, enquanto a segunda, é pura explosão, nitroglicerina das boas, ela dá patada até na sua própria sombra, apesar de tudo, consegui adquirir a sua amizade, inclusive, quando vou por lá, peço a sua benção e a chamo de “mamãe” (na brincadeira, é claro!).

Os amigos dizem, que eu ficarei como “merdeiro” do casal, ou seja, irei ficar com uma privada do WC do Bar. 

Existem milhares de piadas relacionados ao Bar e ao casal, servindo de referencia para a elaboração, futuramente, do livro de anedotas “Piadas & Causos do Bar do Armando”

O Armando é um gozador nato, ele gosta de fazer as famosas pegadinhas.

Contam os mais antigos que, no tempo em que ele vendia secos e molhados, chegou por lá um caboquinho (trabalhava numa casa de família, nos arredores do Largo de São Sebastião), fez o seguinte pedido:

 - Sêo Armando, eu quero um quilo de milho. 

Ele respondeu: - Atendo somente se trazeres o Galo, ó pá! 

O caboquinho foi à casa do patrão e trouxe embaixo do braço o galináceo.

 – Tá qui o Galo! Ele atendeu, morrendo de rir da inocência do moleque. 

Dias depois, o garoto voltou a fazer outro pedido:

 - Sêo Armando, eu quero um quilo de alpista.

 Ele, na maior sacanagem: - Atendo somente se trazeres o passarinho! 

Lá foi o menino para a casa do patrão, voltou com uma gaiola contendo um Canarinho.

 - Tá qui o passarinho! O portuga atendeu, dando a maior gaitada. 

O moleque ficou puto da vida, falou para o patrão que estava cansado de ser sacaneado pelo Armando, prepararam, então, a volta do anzol. 

O caboquinho voltou ao Bar e chamou o Armando:

 - Sêo Armando, dá para o senhor colocar a mão dento desta lata? 

O portuga imediatamente atendeu ao pedido do menino, no entanto, tomou o maior susto e mandou ver:

 - Porra, caralho, isto aqui é merda! 

Ai o moleque deu o troco:

 - O senhor sempre pede para justificar o meu pedido, coloquei merda na lata, pois estou querendo comprar um rolo de papel higiênico! 

Depois dessa, o gajo parou de tirar saro com o moleque. 

Na época da “dita dura”, a nata da intelectualidade se reunia no Bar do Armando, fundaram a famosa Banda Independente da Confraria do Armando, a BICA, para os íntimos! 

Falam os historiadores que os desfiles de carnaval, foi moldado pelo militares, como um puro desfile militar, realmente, parece muito, com alas sincronizadas, marchando com carros alegóricos. 

O pessoal da esquerda arranjou logo um jeito de driblar os “milicas”, sendo os precursores a Banda de Ipanema, no Rio de Janeiro, com muitas marchinhas, uso de metais, samba no pé, com descontração total e muita irreverência, tudo para sacanear com o pessoal “linha dura” dos quartéis.

Logo serviu de inspiração para os “Biqueiros” de plantão de Manaus, foi sucesso total, os responsáveis foram: Armando Soares, Celito, Mona, Aldísio Filgueiras, Mário Adolfo, Afonso Toscano, Simão Pessoa, dentre outros.

Atualmente, a Banda faz parte do calendário turístico de Manaus, está sob o comando do Jomar Fernandes, Marcos Gomes, Francisco Cruz, Deocleciano Bentes, Manoel Batera e Anchieta Lins. 

A Banda é caracterizada pelos bonecos gigantes, feitos pelo Paulo Mamulengo, pelas velhas marchinhas de carnaval e, muita irreverência. 

Toda essa turma não frequenta mais o Bar do Armando, vão por lá de uma forma bastante esporádica, mas nunca deixaram de colaborar e organizar os “esquentas” do carnaval, a Banda, a Festa do Talco e do projeto musical “Armando Felicidade”. 

A Banda da Bica foi tema para a elaboração do livro “Amor de Bica”, sob o comando do jornalista Orlando Farias, com a colaboração do Mario Adolfo, Simão Pessoa e Marco Gomes, ainda existe alguns exemplares a venda no Bar.  

Os empregados do Bar parecem que foram escolhidos a dedo, para não dizer o contrário, somente para ter uma ideia, o Armando tinha um garçom chamado Charles, o cara era rápido no atendimento, atendia na maior presteza, chamava todos os clientes de “cinco estrelas”, aproveitava a amizade com os clientes e vendia bastante CD’s, começou logo a ganhar grana com a venda e com as fartas gorjetas. 

Certo dia, o Armando deu férias coletivas para a negada, pois iria passar dois meses em Portugal, o Charles aproveitou para vender cervejas ao lado do Bar, depois, foi chamado para ser o garoto propaganda do governador Gilberto Mestrinho, amealhou uma boa grana, conseguindo abrir o seu próprio bar, na Avenida Getúlio Vargas, passou rapidinho de garçom para patrão, quando o Armando retornou, ele já estava com o seu bar aberto, denominado de “Cinco Estrelas”. 

Outro que fez história foi o garçom “Montanha”, pelo apelido, pode-se pensar que era um cara de estatura avantajada, muito pelo contrário, o cara era baixinho, porém, o que tinha de pequeno, tinha de sobra a “gororância”, uma mistura fatal de “goró” com ignorância, o cara quando começava a beber “no serra” (as cervejas dos outros), ficava mais grosso do que papel de embrulhar pregos -, pense numa “fuleiragem”! 

Os fregueses só faltavam estourar as cordas vogais, gritando para o “Montanha” servir uma cerveja, ele não estava nem ai, quando atendia, usava desses termos:

 - O que é caralho! O que tu quer? Vai beber o quê? 

Certa vez, teve um atrito com o dono Bar, foi despedido, fez um acordo e foi trabalhar nos botecos do baixo meretrício de Manaus; uma vez e outro aparece no Bar do Amando, sempre bêbado, fica o tempo todo enchendo o saco de todo mundo – ele é nosso amigo, gostamos muito dele, gente fina, da melhor qualidade, mas, se puder, evite-o! 

Tudo passa, tudo muda! O Bar do Armando, mudou, também! 

A velha guarda não frequenta mais o pedaço -, alguns remanescentes da época de ouro da BICA, ainda passam uma vez e outra por lá. 

O Armando e a Dona Lourdes, estão doentes, a Ana Cláudia, a filha mais velha está tomando conta do estabelecimento, porém, possui o mesmo gênio da sua genitora, criou algumas inimizades, porém, está mudando para melhor, espero que ele não jogue fora os milhares de discos de vinis e o velho e cansado Toca Disco

Ela conta com a ajuda do Francisco, um português da melhor qualidade, além de três garçons malucos, um é doido de pai e mãe, o outro é evangélico da Universal, no entanto, gosta de cantar música brega, fumar e beber cerveja, o terceiro é gaúcho dos pampas, nasceu numa cidade chamada de “Pau Fincado”, ele costuma falar que na sua cidade, era um respeitado garçom, vendia muito a cerveja Caracu, os clientes pagavam somente cinquenta centavos pela Cara, o resto ele dava de graça!

 É mole! Por incrível que pareça, o imóvel onde está o Bar, pertence aos padres capuchinhos da Igreja de São Sebastião, está alugado faz mais de quarenta anos, foi um casamento perfeito entre o profano com o santo, o cara vai à missa e depois para no Bar para tomar uma cerveja e comer um sanduiche de leitão, quem sempre fazia essa via crucis era a Rainha da Bica, uma octagenário conhecida como Petrolina. 

O Bar do Armando é seguidamente, premiado, pela Revista Veja, como o melhor boteco de Manaus. 

O quadro acima, ficou durantes vários anos jogado nas prateleiras empoeiradas do Bar, não sei que fim levou nem quem é o seu autor. 

O que escrevi é apenas um aperitivo, tem muita coisa para contar. 

Acredito que o Armando não voltará mais para o seu Bar, pois, o calor do forno para assar o pernil, combinado com o abrir e fechar dos freezers, já lhe deu várias pneumonias, sem chance de se dar ao luxo de pegar mais uma, pela sua idade avançada, será fatal! 

Não sei o que ele irá fazer, pois o seu Bar é a sua vida. É isso ai.

Um comentário:

A.M. Consultoria disse...

Nossa, Rocha... Eu viajo nesses posts sobre o Armando e família. Admiro a garra desse portuga que enfrentou muitas mudanças, de país, de cultura, de épocas e não mudou seu jeito, foi sempre autêntico, "em gênero, número e grau" português, que cativou e cativa pessoas até os dias atuais.
Lamento que esteja com a saúde debilitada, mas à distância e no anonimato, desejo melhoras para e ele e sua esposa.
Armando, nos facilitou ter um dos melhores carnavais de rua de Manaus. Sempre foi e sempre será, se depender dos fãs não assiduos do bar, mas com muita vontade de dar continuidade a essa tradição irreverente que é a BICA.
Energias positivas sempre...
Que venham os "esquentas" e que Armando possa dá o ar de sua graça.
Aproveito para parabenizar você pelos posts, que nos trazem a antiga Manaus, que não é valorizada por muitos.

Até o próximo comentário.

Marcela Fróes