Este termo
não está mais em voga, atualmente, os jovens chamam de “bad boy” ou galeroso,
significando uma pessoa de índole duvidosa e mau caráter; o Adelson foi um
colega de infância, morava no Igarapé de Manaus, tinha a fama de ser um mau
elemento, era o brigão da rua, bronca era com ele mesmo, não levara desaforo
para casa, quando enfrentava o “Nego Mau”, o bicho pegava, saia faísca para
todos os lados.
O meu
irmão Rocha Filho era amigão do peito do Aldenor, irmão do Adelson, certa vez,
foram os três comprar pão na Padaria Frankfort, na Avenida Joaquim Nabuco, o
lance era o seguinte: as pessoas faziam fila no caixa, após o pagamento,
recebiam uma notinha contendo o valor da compra e a relação dos produtos,
depois do atendimento, o funcionário dava uma rubrica no documento.
Ao chegar
ao estabelecimento, o Adelson deu de cara com um ticket zeradinho jogado no
chão, na maior foi até o balcão e, recebeu cinco quilos de pães, dois pacotões
de biscoitos e dois de bolachas, colocaram no lombo e correram pela Rua Lima
Bacuri, entraram pela Rua Dr. Almino.
Quando
estavam chegando na Ponte Cabral, foram alcançados pelo Sr. Matias, o dono da
padaria, ele tinha descoberto que aquela mercadoria já tinha sido atendida em
duplicidade, correram em disparada, passaram por debaixo da Primeira Ponte,
jogaram os pães numa pocilga e correram para casa, chegando lá, deram de cara
com o Sr. Matias, ai o bicho pegou, o pai de Adelson teve que pagar a conta,
imaginem a surra que os dois irmãos pegaram, o Rocha conseguiu se safar.
Pois é, o
caboclo do Adelson pegou a fama, tudo que acontecia de ruim na rua, a culpa era
sempre imputada ao Adelson, o mau elemento do Igarapé de Manaus.
Mudei de
rua e fui morar na Vila Paraíso, tinha apenas doze anos de idade, perdi o
contato com o Adelson, depois de seis anos voltei a encontrá-lo, foi ser o meu
colega de trabalho, era o nosso primeiro emprego, graças à ajuda de um vizinho,
chamado Hélio, ele conseguiu emprego para muitos jovens do Igarapé de Manaus, a
empresa era a Central de Ferragens, localizada na Rua Marechal Deodoro, centro
de Manaus, trabalhavam no ramo de construção e ferragens.
Pois bem,
quando cheguei por lá, o Adelson já tinha experiência de um ano no ramo, ele
ficou responsável em passar alguns conhecimentos de cobrança e faturamento,
antes, ele tentou me batizar.
Na maior
cara dura falou que quando eu chegasse de um dia cansado de trabalho na rua,
deveria me dirigir a uma sala, onde poderia desfrutar de um ar condicionado
Carrier, beber água mineral Perrier, importada da França, tomar café com leite
e detonar bolachas e biscoitos importados, era tudo da melhor qualidade, os
copos eram de cristais e as xícaras de porcelana, saboreava todo aquele manjar
na maior, notava algo estranho, pois os meus colegas não faziam o mesmo, eles ficavam
olhando e cochichando o tempo todo
Num belo
dia, fui surpreendido pelo Sr. Isaías: - Ô caralho, o que estaire a
fazeire aqui, ô moleque? – gritando e saindo fogo pela boca. Por ser safo, me
sai direitinho: - Estou apenas lavando os copos e as xícaras! Ele não gostou: -
Fora daqui, não quero nenhum funcionário dentro do meu gabinete! – gritou
novamente e, batendo a porta na minha cara.
Cruz,
credo, o Adelson tinha armado para cima de mim, pois o local era a sala do dono
da empresa, um português brabo no balde! Quando sai de lá, todos estavam rindo
da minha cara, não deixei passar em branco, fiz o mesmo com outro boy novato.
Eu tinha
uma missão de entregar aos clientes um documento chamado “aviso de cobrança”,
rodava a cidade toda de ônibus, certo dia, o Adelson me aconselhou: - Rocha
deixa de ser leso, pega o dinheiro da passagem e me repassa, agente faz as
entregas junto na minha moto, coloco gasolina na “setentinha” e ainda vamos
merendar no Aeroporto de Ponta Pelada, o que não der para entregar, agente
rasca e joga no lixo!
O lance
foi assim por um bom tempo, depois, fui chamado no “saco”, o Hélio descobriu a
parada, o mau elemento do Adelson fazia a entrega de todos os avisos dele e,
quanto aos meus, a metade ficava “boiando”, eram exatamente os que eram
rasgadas, entrei mais uma vez pelo cano!
Fomos
promovidos para “Cobrador de Duplicatas”, o Adelson era o líder, separou as
novinhas para ele e mais antigas para mim, ele falou que eu teria que mostrar
para a Diretoria que era um bom profissional, tinha que mostrar serviço, cobrar
e receber aquelas duplicatas consideradas impagáveis, caso conseguisse, iria
receber uma bela comissão e poderia até ser novamente promovido para trabalhar
internamente no setor de faturamento.
Recebi
dele algumas aulas de como ser um cara-de-pau, como falar em público, ser
persistente, não desistir nunca e como ganhar alguém no papo; quando estava
“preparado” entrei em campo.
O primeiro
foi um escritório de engenharia, o dono tinha um papo de derrubar avião,
contava piadas, me servia guaraná com bolachas, chorava miséria, sempre ficava
para amanhã o pagamento.
Resolvi montar
acampamento na entrada da empresa dele, passei duas semanas em encalço do
pilantra, o cara se enjoo da minha cara, fiz uma negociação com ele, dividi em
parcelas, todo mês ele pagava religiosamente, tornou-se meu amigo e quitou a
divida.
Outro cliente
inadimplente era um dentista, o consultório dele ficava num edifício da Rua
Henrique Martins, toda vez que eu chegava lá, o cara se trancava e me dava chá
de cadeira, um dia eu tinha dormido de cabeça pra baixo, resolvi dar umas
bicudas na porta do dentista, o cara saiu voado, correu atrás de mim, gritava e
gesticulava: - Moleque, filho de rapariga, eu vou te pegar e dar umas porradas
e ainda vou pedir pro Hélio dar a tua conta!
Depois de
uma semana, voltei a cobrar novamente o abusado, todo dia batia na porta dele e
corria, certo dia, resolvi encarar a fera, ele abriu a porta e mandou ver: -
Porra, de novo, tu é muito chato! Vou pagar esta merda só prá não ver mais a
tua cara! Mais dois pontos.
O próximo
era um cara que trabalhava no almoxarife do Hospital da Beneficente Portuguesa,
pense num cara escroto, ele prometia dar pancadas em todo mundo da Central de
Ferragens, o primeiro a apanhar foi eu, ele me pegou pelo pescoço, tomou a
duplicata e rasgou todinha em pedacinhos.
Dei parte
dele na direção do hospital, ele pegou uma tremenda chamada e foi suspenso,
consegui receber o valor da duplicata na secretaria do hospital.
Pelo meu
desempenho e ajuda do Adelson, consegui a promoção, fiquei mais um ano, depois,
fui trabalhar nas Lojas Populares, enquanto o Adelson continuou aprontando na
Central, depois, pegou o beco e nunca mais me encontrei com ele.
Fiquei
sabendo que ele constituiu família, tornou-se uma pessoa de bem, um homem
probo, se aposentou e está curtindo as praias de Fortaleza, cidade que escolheu
para morar. Espero um dia ainda encontrá-lo e lembrar das nossas travessuras de
infância e adolescência. É isso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário