Sempre gostei da malhação de Judas, esta brincadeira vem desde a minha infância
no Igarapé de Manaus, onde os adultos se reuniam a partir das dez horas da
noite da sexta-feira santa e, faziam os ajustes finais nos bonecos, sendo
pendurados somente na madrugada, ficando sempre alguém de vigia para evitar a malhação
antes da hora.
O Judas sempre tinha o rosto parecido com alguém da rua, era uma forma de
malhar algum morador que, durante o ano fez alguma coisa de ruim para com a
comunidade – existia todo um ritual, com direito a leitura de um longo
testamento, mas, o momento mais esperado era quando o Judas era queimado e
arrastado pela rua.
Passando alguns anos, continuei curtindo a brincadeira na Rua Tapajós,
entre as avenidas Ramos Ferreira e Leonardo Malcher – a turma se reunia no boteco
da Tia Wanda, onde o Judas era confeccionado, o problema maior era um morador
da Avenida Getúlio Vargas, o Felipe Viriato, o cara gostava de roubar o nosso boneco
e coloca-lo numa árvore da sua rua – eu ficava possesso com ele, mas, tudo era
brincadeira.
Nos últimos anos, passei a frequentar a malhação de Judas do Bar do Cipriano,
conhecido também como a “Confraria do
Ferrão”, na Rua Ferreira Pena esquina com a Avenida Airão, onde a tradição é
mantida por mais de trinta anos, com a coordenação do meu amigo Agenor Braga.
Segundo antropólogo Ademir Ramos “A
tradição vem de muito longe. Na antropologia cultural registra-se como um dos
ritos das sociedades rurais do medievo, passando pela Península Ibérica e sendo
reinventada por toda a América Latina. No Brasil, sua manifestação era marcante
na antiga capital da República, no Rio de Janeiro, onde o Judas tinha a
configuração diabólica e em seu interior depositavam fogos pirotécnicos,
provocando explosões com luzes coloridas seguido de muita gritaria e manifestações
populares. O fervor dos brincantes era tanto, que deixava a polícia desnorteada
sem saber por onde começar a debelar o fogaréu. Resultando, dessa feita, na
proibição da manifestação no centro urbano da antiga capital federal. Na
verdade, não era o fogo que incomodava, mas a picardia dos brincantes que
ironizavam os políticos de então, fazendo sua malhação em praça pública. Em
Manaus, ainda se cultua essa prática, sobretudo no Bar do Cipriano, onde os
políticos são malhados pelos justiceiros de plantão”.
Tudo que é bom, um dia acaba! Infelizmente, a tradição de malhar Judas
está acabando – as novas gerações não valorizam esta brincadeira – dei um pulo até o Bar do Cipriano e, para minha surpresa, não fizeram a malhação de Judas este ano. Já era!
2 comentários:
E o "serra-velha", que está em desuso...
Bem lembrado o "serra-velha". A molecada fazia um boneco da mais velha da rua, a que já tinha idade para morrer :-). A última de que me lembro foi na Rua 10 de Julho, depois da praça São Sebastião, nos anos 1960.
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