I PARTE
O Zé Mundão nasceu
na Santa Casa de Misericórdia, na década de cinquenta, quando veio ao mundo,
estavam batendo as doze badaladas dos sinos da Igreja de Sebastião, exatamente
no dia do aniversário do Presidente Juscelino Kubitschek; os seus familiares
ensaiaram em chamá-lo pelo prenome do mandatário maior da nação, mas, ao ser
batizado na Igreja dos Remédios, recebeu na pia batismal o nome de José, em
homenagem ao seu avô, um cearense que veio para a Amazônia coletar o látex. O seu
primeiro lar foi um “flutuante”, uma casa de madeira apoiada por duas enormes
toras, própria para flutuar na enchente do Rio Negro, no Igarapé de Manaus.
O local onde morava o Zé era conhecido como “Cidade
Flutuante”, que teve início em decorrência do declínio do fausto da borracha e,
com a falência dos seringalistas, levou uma multidão de seringueiros a ficarem
sem eira nem beira, não tinha onde morar, a solução foi iniciar a construção de
suas casas sobre as águas do Rio Negro e pelos igarapés de Manaus.
As residências eram construídas sobre troncos de
árvores, tornando-as flutuantes, com os assoalhos e todos os cômodos de
madeira, sendo a cobertura de palhas e zinco, formavam um imenso conglomerado
de casas, era tão grande que chegou a ser uma “cidade” dentro da cidade de
Manaus, com mais de 2.000 casas e aproximadamente 12.000 habitantes.
Neste local, existia além de moradias, todo tipo de
comércio: lojas de secos e molhados, ferragens em geral, tabernas, restaurantes,
protéticos e dentistas, consultórios médicos, drogarias, oficinas mecânicas de
consertos de motores de centro e popa, vendas de borrachas, castanhas, jutas,
couros e peles de animais silvestres; qualquer atividade que tinha em terra,
também tinha na cidade flutuante! Era realmente, uma cidade dentro da cidade de
Manaus. As pessoas mais abastadas achavam que aquilo era um cancro, uma
vergonha para os habitantes de terra firme, mas, foi exatamente onde o pequeno
José passou a sua infância, por sinal, muito feliz.
Por ser um filho e neto de uma família de cearenses de Uruburetama, para não fugir a exceção, passaram-no a chamá-lo de Zé, um diminuitivo carinhoso de José, era o mais novo da prole, o caçula querido da família; os seus irmãos mais velhos eram conhecidos como Zé Galinha, Zé Pacú e, a única mulher, foi batizada de Maria José, tinha que ter José no meio de qualquer maneira.
Por ser um filho e neto de uma família de cearenses de Uruburetama, para não fugir a exceção, passaram-no a chamá-lo de Zé, um diminuitivo carinhoso de José, era o mais novo da prole, o caçula querido da família; os seus irmãos mais velhos eram conhecidos como Zé Galinha, Zé Pacú e, a única mulher, foi batizada de Maria José, tinha que ter José no meio de qualquer maneira.
Não foi muito chegado ao leite materno, desde
novinho foi criado à base de “Mingau de Banana Verde”, “Araruta” e “Cremo
Gema”, depois, a sua dieta passou a ser direto o peixe; por ser um pobre
ribeirinho, não tinha acesso aos produtos industrializados, tudo era natural,
fez também a “dieta da sopa”, ou seja, deu sopa ele comia, não fazia cerimônia,
comia feito uma draga.
Pegou aquelas doenças comuns da sua época, como a
Papeira, Catapora e Sarampo, criou bastante lombriga no bucho, pegou muita
Frieira e Mijacão; as suas doenças eram curadas a base de Mamona, Jalapa Pião,
Copaíba, Andiroba, Chá de limão com Melhoral, Xarope Caseiro e, pegou muita
surra para tomar Magnésia.
Por morar num flutuante, dentro d’água, por questão
de segurança, os seus pais o ensinaram a nadar ainda bem novinho; na sua
residência não tinha água encanada e nem luz; bebia água de Pote e tomava
banho no igarapé e nas cacimbas das redondezas; a casa era iluminada com
Lamparinas e Candeeiros; o café era torrado e pilado em casa; a comida era
feita num Fogão a Lenha; as roupas eram passadas em Ferro de Engomar a Carvão;
tinha em sua casa poucos móveis, somente uma mesa de jantar com alguns
tamboretes, um guarda-roupa simples e uma cristaleira - apesar de todas as
dificuldades materiais, era um caboquinho feliz, cresceu forte e sadio e,
começou a aprontar desde cedo.
Os seus brinquedos eram feitos manualmente por seu
pai, um exímio marceneiro, curtiu todas as brincadeiras que as criançadas de
Manaus gostavam naquele tempo: Papagaio de Papel, Pião, Caroço de Tucumã,
Bolinha de Gude, Cangapé, Boi de Pano, Macaca, Manja, Cemitério e Barbandeira.
Certa vez, ganhou de presente da sua madrinha um
Globo Terrestre de plástico, passava horas e horas girando a esfera, parava e,
ficava apontando com o dedo indicador: - Quando eu crescer irei viajar muito e,
conhecer a França, a Itália, o Japão, o Portugal, a Alemanha, alguns países da América
do Sul e os Estados Unidos, aliás, quero conhecer o mundo todo! – falava de uma
forma determinada. Foi um passo para os seus colegas de rua o apelidar de “Zé
Mundão”.
Quando ficou mais taludinho, recebeu a missão de
esperar o “Padeiro” e o “Leiteiro” na rua; num belo dia, deixou o pão e o leite
escondidos e foi pegar “Mangas” e “Biribas” num terreno de um enigmático
senhor, conhecido por Dural. Quando retornou, alguém tinha comido o “bico do
pão” e um gato havia derrubado a leiteira e, estava lambendo o leite; a bronca
ia ser alta pro Zé, mas, ele era um cara esperto: - Vou completar o litro de
leite com água, não quero nem provar, pois está cheio de pelos do gato, vou ver
se o papai engole essa! – pensando rápido numa saída. Dito e feito, o Zé tomou
o “café puro” e ainda teve que explicar que foi ele quem comeu o “bico do pão”,
depois de algum tempo, falou do ocorrido para o seu irmão mais velho, o Zé
Galinha, foi dedurado, pegou uma surra daquelas e ainda ficou um mês de
castigo!
O Zé tinha uma vizinha que falava o tempo todo
palavrões, aprendeu rapidinho todo o vocabulário, pegou muito “tapa na boca”
para perder aquele costume feio, mas, o famoso “sinal com o dedo” ele não
deixou de mostrar para as pessoas que o acomodava: - Tá qui prá ti, sêo leso! –
gesticulando e gritando.
Estudava no Barão do Rio Branco, a sua avó o
matriculou no primeiro ano forte, mas o Zé não sabia ler nem escrever, a
primeira tarefa na escola era fazer uma cópia, na malandragem, pediu ao seu
colega "Nascimento", para fazer a cópia, o seu confrade era canhoto,
pegou o caderno do Zé Mundão, virou na melhor posição e fez a cópia todinha.
O Zé foi entregar o trabalho: - Fessora
Genevova, tai a cópia, tá bonita? – falou todo gabola da vida. - Vá fazer outra
cópia, você fez com o caderno de cabeça para baixo! – dando-lhe aquele ralho.
Não se conteve, chorou que nem um bezerro desmamado, a professora
descobriu que ele estava na série errada e o encaminhou para a “Alfa”;
cobrir as letras foi uma graça para Zé Mundão.
O que ele mais odiava era o “hora da merenda”, não
trazia nada de casa e tinha que encarar aquele “leite de soja” que era enviado
ao Brasil em decorrência do projeto “União para o Progresso” dos ianques; o
jeito era filar a merenda dos meninos do pré-escolar, num certo dia, foi pego e
levado pela “orelha” até à Diretoria, os seus pais foram chamados à atenção.
Na sua defesa, falou que fazia aquilo em decorrência
de não trazer nada para lanchar e que tinha dor de barriga toda vez que tomava
aquele leite ruim. Moral da história: ganhou uma “Lancheira” novinha em folha,
com direito a suco de “Maracujá” e Sanduíche de “Pão com Pão”, a partir dai,
começou a adorar a hora de merenda, gostava de deixar os seus colegas com água
na boca e, nunca mais tomou o famoso "leite de posto"!
Tempo depois, saiu do “flutuante” e vou morar com a
família numa “casa de madeira” em terra firme, fora proibido de tomar banho no
igarapé, mas, não tinha jeito, tirava o calção, colocava num arbusto qualquer e
pulava pelado dentro d’água, pois não era hábito usar cuecas naquela época. Num
final de semana, o seu “amigo da onça” o famoso “Nego Mau”, escondeu a roupa do
Zé Mundão, o coitado passou a tarde toda dentro do rio, deixou a noite chegar e,
correu pelado pela rua até chegar à sua casa, todos os moradores achavam graça
daquela cena inusitada, ainda foi gozado por bastante tempo, mas o cara sabe
muito bem dar o troco: - Vou dá um tempo no tempo, pegarei o escroto do “Nego
Mau” e todos os amigos deles que ficaram me gozando! – prometendo uma desforra.
Num belo sábado à tarde, estava o “Nego Mau” e toda
a sua galera tomando banho pelado no rio, como de costume, eles também não
usavam cuecas; o Zé foi bem de mansinho e, pegou os calções de todos eles,
quando estava bem distante, gritou: - Ei, ei, Negou Mau, olha aqui, estou com o
teu calção e da tua galera, quero ver todo mundo pelado, sai da água se tu é
macho, sai! Foi um Deus nos acuda, prometeram uma bela sova no Zé, mas, ele não
estava nem ai!
À noite, toda a molecada da rua estava à beira do
rio, esperando a galera do Nego Mau sair da água, não deu outra, todo mundo
correndo pelado pela rua em direção as suas casas, foi uma gozação total. O Zé
ficou uma semana sem sair da sua casa, somente ia à escola, escoltado pelos
seus pais, mas, um dia pegaram o Zé Mundão sozinho, deram a prometida surra
nele e ainda tiraram o seu calção, teve que correr novamente pelado pela rua
até chegar a sua casa! Haja gozação! Mais uma semana hibernando em sua casa,
estava cansado de servir de chacota.
Teve uma criação bastante rígida, mas, não tomava
jeito, aprontava muito, ficava na maioria das vezes de castigo, fugindo sempre
para brincar na rua. Na enchente do Rio Negro, gostava de pular dentro do rio
do alto das pontes, as preferidas eram a Ponte Romana I e II, na Avenida Sete
de Setembro – a única que ele respeitava era a Ponte de Ferro, por ser bastante
alta. Escalava os muros dos vizinhos para pegar Mangas, Pitombas e Biribas,
além de morcegar carroças e caminhões que passavam pela sua rua.
Observação: O Zé Mundão de Manaus é um personagem criado por mim, fiz algumas postagens sobre ele e, aproveitei para converter em livro (muita audácia da minha parte). Na realidade, conta parte da minha parte da minha vida, dos meus colegas e, da minha amada Manaus. É uma mistura de realidade com ficção e, muito humor. Publiquei apenas o resumo do resumo da parte inicial do livro que pretendo lançar ainda em 2012. O texto acima, ainda carece de pesquisas e revisão. Aceito criticas e colaborações. Devo ou continuar escrevendo? Abraços. Rocha