Por José Rocha
Nos últimos tempos, a administração do Porto de
Manaus tem ganhado destaque na imprensa local, especialmente em matérias
divulgadas pela Rede de Rádio e Televisão Tiradentes e pelo Portal BNC, que
colocaram no centro das atenções o senhor Alessandro Bronze.
O tema desperta muito o meu interesse, pois sempre
fui apaixonado pela história da nossa cidade. O Porto de Manaus — o Roadway —
faz parte não apenas da memória da nossa capital, mas também da minha trajetória
pessoal: marcou minha infância, minha vida profissional e o meu trabalho como
historiador dedicado à preservação da história de Manaus.
Na minha infância, meu saudoso pai levava-me para
passear no cais do porto. Eu ficava impressionado com o tamanho dos navios
ancorados — aquilo me marcou profundamente. Na fase adulta, trabalhei para
muitas empresas do comércio e do Distrito Industrial, sempre na área de
comércio exterior, o que me permitiu entrar no porto centenas de vezes para
acompanhar despachantes e liberar mercadorias estrangeiras. Viajei muito para o
interior, na maioria das vezes partindo e retornando pelo Roadway. Após
aposentado, ainda caminho por lá, para lembrar os velhos tempos e admirar o
maior porto flutuante do mundo.
A história do porto é bem conhecida por quase todos
os manauaras. Desde a sua construção, em 1906, administrado inicialmente por
ingleses durante o ciclo da borracha, até se tornar ainda mais visível no
início dos anos 2000, quando o então governador Amazonino Mendes transferiu a
administração do Porto de Manaus para uma empresa controlada pela família do
ex-senador Carlos Alberto De Carli. Esse processo de privatização foi bastante
contestado e gerou longas disputas judiciais.
Em 2002, a deputada federal Vanessa Grazziotin
(PCdoB) solicitou uma auditoria especial na SNPH, apontando diversas
irregularidades. Uma das principais acusações era de que Amazonino Mendes teria
repassado cerca de R$ 35 milhões em recursos públicos para empresas da família
De Carli, visando realizar a privatização. A crítica central era de
que a privatização teria sido feita com dinheiro público. O Tribunal de Contas
da União (TCU) chegou a avaliar relatórios sobre o processo, dada a gravidade
das denúncias de má gestão e uso indevido de recursos.
O governador baseou a “privatização” do Porto de
Manaus na Constituição Federal de 1988 (CF/88), Artigo 20, inciso VI, que
estabelece que os portos marítimos, fluviais e lacustres são bens da União. Já
o Artigo 21, inciso XII, alínea "j", permite que a União delegue a
administração desses portos para estados, municípios ou consórcios públicos, ou
ainda conceda à iniciativa privada, mediante contratos de concessão ou
arrendamento, conforme a legislação específica (como a atual Lei nº
12.815/2013, conhecida como Lei dos Portos).
Em 2013, pessoas ligadas à administração do Porto
de Manaus tiveram bens e valores bloqueados pela Justiça Federal, em uma ação
civil pública por improbidade administrativa movida pelo MPF. O motivo: a venda
ilegal de bens pertencentes à União, como partes do cais flutuante e ônibus.
Curiosamente, anos depois, em 2018, durante seu
quarto mandato como governador, o próprio Amazonino Mendes assinou um termo
para que o Governo do Estado reassumisse a administração do Porto de Manaus,
citando a necessidade de o estado retomar o controle da política portuária.
Com a construção da Manaus Moderna, na Avenida
Lourenço da Silva Braga, o Porto de Manaus passou a estar interligado com o
Distrito Industrial — os navios de longo curso e de cabotagem descarregavam
contêineres nos pátios do porto, e, após liberação, esses eram transportados
até o DI. Porém, com a implantação de dois portos no Paredão, bem próximos ao
Distrito Industrial, o Porto de Manaus perdeu uma importante fonte de receita.
A administração do porto resolveu, então, alugar
seus armazéns, fechou o Museu do Porto e destruiu um armazém próximo ao Mercado
Adolpho Lisboa para a construção de lojinhas — o que acabou sendo interditado
pelo IPHAN após a demolição. Interditou também a Travessa Vivaldo Lima,
transformando-a em via exclusiva para veículos que acessam o porto, além de
ocupar o Palácio do Tesouro do Amazonas — casarão que havia sido reformado com
verba federal para abrigar a Casa de Leitura Thiago de Mello — e o Armazém 15,
que deveria ter sido aberto ao público. Houve também a destruição de todo o
quarteirão onde atualmente está sendo recuperado o Complexo Booth Line.
A gestão do Porto de Manaus foi retomada pelo poder
público em 2019. A administração foi novamente delegada ao Governo do Estado do
Amazonas, por meio de convênio com o Governo Federal, substituindo a gestão
anterior que incluía a Companhia Docas do Maranhão (Codomar), posteriormente
extinta.
Tudo isso gera muita confusão:
Os portos brasileiros são de responsabilidade do
Ministério de Portos e Aeroportos. Além disso, a Agência Nacional de
Transportes Aquaviários (ANTAQ) é a autarquia federal encarregada da regulação
e fiscalização do setor portuário e aquaviário.
O Estado do Amazonas, por sua vez, foi delegado
pela União para exercer o papel de autoridade portuária, por meio da
Superintendência Estadual de Navegação, Portos e Hidrovias do Amazonas (SNPH).
Quanto à exploração comercial, o Governo do
Amazonas delegou, em 2001, a gestão para a Empresa de Revitalização do Porto
de Manaus S/A (ERPM) e para a Estação Hidroviária do Amazonas S.A. (EHA),
no contexto da privatização e subsequente reestruturação da administração do
porto após o polêmico período da família De Carli. Essa empresa é uma Sociedade
Anônima Fechada, ou seja, não possui ações na Bolsa de Valores. De acordo com
sites de busca, o CNPJ é 04.487.762/001-15, última alteração em
03/11/2005, com sede na Rua Marquês de Santa Cruz, 25. Constam os
dirigentes/sócios: Walmir Oliveira de Mendonça, Raimundo Nonato de Souza Lopes e
Kamila Oliveira Flores.
Atualmente, tanto a Rede de Rádio e Televisão Tiradentes
quanto o Portal BNC mencionam o nome do senhor Alessandro Bronze como figura
ligada à administração do Porto de Manaus. De fato, seu nome aparece em
registros relacionados aos períodos de privatização e disputas judiciais —
sendo citado como “ex-administrador do porto privatizado de Manaus” em notícias
de 2013 e como gestor vinculado ao clã De Carli nos anos 1990 e 2000. O
empresário e radialista Ronaldo Tiradentes criticou publicamente Bronze,
acusando-o de "ganhar uma fortuna no Porto de Manaus" e de penalizar
a população mais pobre com a cobrança indevida de pedágios pela gestão
portuária.
Recentemente, surge também o nome da empresa DCBR
Participações Ltda., CNPJ 31.616.644/0002-07, filial criada em
02/10/2023, com sede no mesmo endereço: Rua Marquês de Santa Cruz, 25. Os
sócios-administradores: Alessandro Bronze Toniza e Carlos Antônio De
Carli.
Resumo da Ópera:
- A
União é a
proprietária do Porto de Manaus.
- O
Governo do Estado do Amazonas é a autoridade portuária.
- A
Estação Hidroviária do Amazonas S.A. (EHA) é
quem atualmente administra e opera o porto.
- A holding DCBR Participações Ltda., dos sócios, Alessandro Bronze Toniza e
Carlos Antônio De Carli Filho, possivelmente é a sócia majoritária da
EHA. Ou seja, são eles que devem comandar de fato o Porto de Manaus.
O ministro dos Portos e Aeroportos, Sílvio Costa
Filho, estará em Manaus nesta segunda-feira (29 de setembro) para
participar de diversas cerimônias, incluindo a entrega de balsas e uma viagem
para Eirunepé e Envira. Será uma excelente oportunidade para ele conhecer in loco a situação atual do Porto de Manaus.
Um detalhe importante: o Governo Federal, por meio do PAC, investirá R$ 900 milhões na construção do novo Porto da Manaus Moderna (atrás do Mercado Adolpho Lisboa). Após sua conclusão, é possível que a gestão seja delegada à Prefeitura de Manaus, que, por sua vez, poderá concedê-lo à iniciativa privada para exploração comercial.
E se essa concessão cair novamente nas mãos da DCBR Participações Ltda.?
Ficará tudo nas mesmas mãos!
Fontes: BNC/EHA/Gemini/ChatGPT/IPHAN/RF/Google/TV
Tiradentes/