quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

VIAGENS DE JORGE AMADO EM MANAUS

 

  José Rocha

O grande mestre da literatura brasileira, Jorge Amado (1912-2001), viveu duas aventuras na cidade de Manaus, separadas por quatro décadas. A primeira, em 1937, quando fugiu da perseguição da ditadura do Estado Novo e encontrou refúgio na floresta amazônica. A segunda, em 1977, quando voltou com a família para matar a saudade da cidade e dos amigos que fez na sua juventude.

Jorge Amado chegou a Manaus em 1937, com apenas 25 anos, trazendo na bagagem a sua rebeldia e o seu talento literário. O artista plástico Moacir de Andrade (1927-2016), contou em um jornal o seguinte: “Segundo relatos,o Jorge Amado veio fugido da Bahia, pois ele era comunista de carteirinha e queriam prendê-lo ou matá-lo. Ele pegou um navio e veio para Manaus por ser muito distante. Quando ele esteve aqui pela primeira vez eu tinha apenas 10 anos e não tive contato com ele”.

Em Manaus, Jorge Amado fez amizades com intelectuais e artistas locais, como Agnello Bittencourt (membro da Academia Amazonense de Letras e um dos fundadores do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas) e Epaminondas Baraúna (Superintendente do Jornal do Comércio), que lhe deram apoio e acolhida.

Há relatos de que Jorge Amado foi preso em Manaus e dividiu uma cela com Nunes Pereira, um antropólogo, folclorista e conhecedor da cultura amazônica. Os dois eram opositores do regime de Getúlio Vargas e acabaram presos por suas ideias, além de um comerciante português, que não tinha nada a ver com política, mas era sogro de um dos envolvidos na Intentona Comunista.

Jorge Amado viveu na pele o drama da censura e da violência política, que marcou a sua geração. Certo dia, em sua cela, ouviu de um policial que os seus livros apreendidos estavam sendo vendidos, pois havia muita procura e o lucro era garantido.

Passados alguns dias, o chefe de polícia o chamou para perguntar por que ele estava preso, respondeu que nem ele mesmo sabia. O escritor foi solto, mas ficou em liberdade vigiada. Depois, foi mandado para o Rio de Janeiro, num navio, sob a escolta de um policial que estava de férias no Amazonas.

Ele era formado em Direito, mas nunca exerceu a profissão. Preferiu se dedicar à política e à literatura. Foi deputado federal pelo Partido Comunista Brasileiro, mas teve que se exilar na Argentina, no Uruguai, na França e em Praga, devido à repressão. Voltou ao Brasil em 1952 e abandonou a política em 1955, para se concentrar na sua obra literária.

Quarenta anos depois, o consagrado escritor voltou a Manaus, em 1977, para passar férias com a família e rever a cidade e os amigos. Chegou no dia 21 de junho, a bordo do navio Lobo D´Almada, e foi recebido no Roadway (porto flutuante) pelo Desembargador Paulo Jacob, pelo poeta Antístenes Pinto e pelo artista plástico Moacir de Andrade.

Jorge Amado já era um dos maiores nomes da literatura brasileira e mundial, autor de obras como Gabriela, Cravo e Canela, Dona Flor e Seus Dois Maridos, Capitães da Areia, Tieta do Agreste, entre outras.

Segundo o Jornal A Crítica: “Ele não se esquivou e, num diálogo conciso, mostrou, entre outras coisas, a sua fé na renovação literária brasileira, chegando mesmo a enaltecer a sua afeição pelos jovens escritores e pelos que se dedicam à leitura de um conto, de uma poesia, de um romance”.

Ele veio com a sua família: Zélia Gattai (esposa), João Jorge Amado (filho), Paloma Amado Costa (filha), Pedro Costa (genro) e ficou hospedado no Tropical Hotel. Passou a maioria do seu tempo com o Moacir de Andrade, com quem concedeu uma entrevista para o Jornal A Notícia em seu ateliê na Rua Comendador Alexandre Amorim, 253, no bairro de Aparecida.

Nos jornais do Comércio e A Crítica, ele declarou que fora convidado para receber homenagens na Universidade Livre do Bar Caldeira, na companhia de seu amigo Moacir de Andrade.

Segundo o seu cicerone, o escritor visitou, também, o Mercado Municipal e outros pontos turísticos. Gostava de tomar banhos nos igarapés e fez uma viagem de barco até Manacapuru, para conhecer a realidade dos caboclos da região. Contou, também, que ele disse que queria conhecer um bordel, mas não teve como ir porque a mulher dele estava toda hora por perto.

Ele partiu de Manaus quatro dias depois, não mais retornando à nossa cidade. Faleceu em 2001, mas a sua passagem por essas terras foi marcante e faz parte da nossa história.

 

Fontes:

Jornal do Comércio

Jornal A Crítica

Jornal A Notícia

https://www.amazonamazonia.com.br/2021/05/23/preso-em-manaus-jorge-amado-acabou-compadre-do-tira-que-o-vigiou/