O Luthier Rochinha, um
cearense cabra da peste, mas, amazonense inconteste - aprimorou a sua profissão
com um português conhecido no meio artístico como Nascimento, proprietário da
fábrica de instrumentos de cordas “Bandolim Manauense” – fez história em Manaus
pelo seu amor a arte e as pessoas e, esta postagem é dedicada e ele e, a
incrível história do seu motor de centro.
A sua oficina-casa ficava
num flutuante no Igarapé de Manaus, na época em que o Rio Negro fluía livremente
no seio da nossa cidade, hoje, totalmente barrado pelos aterros e dos
“Prosamims” da vida – por ser um artista que trabalhava com instrumentos
musicais, a sua principal matéria-prima era a madeira, inicialmente, comprada em
tábuas nas serrarias que ficavam nos arredores do bairro de Educandos.
Possuía muitas
dificuldades em beneficiar o cedro, a macacaúba e o marupá, pois não dispunha
de serras circulares ou de fita - o único jeito era partir para o penoso
trabalho com um serrote bem amolado – certa vez, instalou luz elétrica em sua
oficina e, resolveu comprar um motor possante para facilitar o seu honrado
trabalho.
Não tinha dinheiro e muito
menos assessoria técnica, mas, possuía crédito na praça – então, partiu para a
escolha do motor ideal – entrou numa loja conhecida como Antônio M. Henriques,
na Rua Marechal Deodoro e, escolheu um motor muito possante e caro.
O pagamento fora acertado
em doze “suaves” prestações (no carnê), pois naquele tempo todo mundo se
conhecia em Manaus e, um fio de bigode tinha o seu valor. Para poupar e ajudar no
pagamento, deixou de fumar, pois consumia em média três maços de cigarros por
dia – fez uma boa economia e contribuiu para a sua saúde física.
O motor foi transportado
na carroceria de um velho caminhão Ford, mas, o problema maior foi transferi-lo
da Rua Igarapé de Manaus até o flutuante onde seria instalado – várias pessoas
ajudaram, foi um trabalho penoso, mas, conseguiram colocá-lo no lugar exato.
Passado todo aquele
sufoco, chegou o momento de um técnico fazer a instalação e, colocar para
funcionar aquela pesada fera – quando o homem botou o olho na máquina, foi logo
disparando: - Sêo Rocha isto aqui é um motor de centro, ele serve apenas para
movimentar embarcação!
O velho Rochinha foi a
loucura, chorou e babou de raiva: - É agora, José? Tô na merda, pois fui
enganado, o vendedor me induziu a comprar a máquina errada!
Pense num cearense cabeça
dura, ele simplesmente decidiu ficar com o motor de centro e, fazer as devidas adaptações,
transformando o seu flutuante num barco regional! É mole ou quer mais!
Pois bem, ele instalou um
tanque de combustível, uma bomba d’água, dois tanques externos para fazer a
refrigeração (a água) do motor, descarga, parte elétrica ete cetara – a partida era feita manualmente através de uma manivela
(movimento de rotação com a mão), quando o motor pegava, a zoada era igualzinho
a de um motor regional – o negócio era folclórico, pense numa cena dessas!
Na parte do motor em que
deveria movimentar a hélice do barco, foi colocada uma polia (roda presa a um
eixo), com uma imensa correia (tira de couro) para movimentar uma serra (disco
dentado de aço) presa a uma bancada de madeira, onde eram cortadas as madeiras
na medida exata para o fabrico de violões e cavaquinhos.
Vez e outra a correia
quebrava, pifava a bomba d’água, faltava o combustível e a água, mas, o motor de
centro adaptado nunca falhou – prestou serviços durante muitos anos, sempre bem
conservado, muito assediado pelos donos de embarcações que encoravam no
flutuante quando da cheia do rio.
Num certo dia, apareceram
rumores de que o governo do Estado do Amazonas e a Marinha do Brasil iriam
desmontar toda a “Cidade Flutuante”, inclusive os flutuantes que ficavam nas
margens dos rios – o velho Rocha foi um dos primeiros a procurar uma casa para
alugar e encontrar um lugar para instalar a sua oficina – ele desmontou todo o
seu imenso flutuante, guardou todas as tábuas e caibros e, encaixotou o seu
motor de centro.
O seu amigo João Bringel
cedeu os porões da sua residência para o velho Rocha instalar a sua oficina,
mas, com uma condição, nada de motor de centro fazendo um barulho infernal – o
jeito foi adaptar uma bancada com uma serra movida por um pequeno motor elétrico - passou a comprar parte da madeira de um compadre que morava no interior, a maior parte vinham beneficiadas (no tamanho exato dos instrumentos).
Cansado de pagar aluguel,
foi visitar uns amigos na Vila Paraíso (entre a Rua Tapajós e a Avenida Getúlio
Vargas), onde estavam sendo vendidos vários lotes de terra – o Rochinha
fechou o negócio na hora e, correu para vender o seu velho e conservado motor
de centro.
Mesmo com o erro da compra
do motor e, fazendo as devidas adaptações, trabalhou, sustentou a sua família
e, o vendeu no momento certo – com dinheiro da venda, comprou o terreno,
aproveitou parte do material do flutuante e, construiu a sua casa, foi o seu
único imóvel, onde morou até a sua morte, tudo graças a compra errada do motor de
centro. É isso ai.
Um comentário:
É o velho ditado: "Deus escreve certo com letras tortas"...
No fim, tudo deu certo, não?
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