quarta-feira, 10 de março de 2021

AS INJEÇÕES DA DONA ROSA

 


        Ela era uma típica enfermeira de antigamente:                     uma senhora de idade que ainda trabalhava nos hospitais públicos. Sempre vestida de branco, gordinha, ranzinza, parecendo estarde mal com o mundo. Mascava um tabaco de corda.                           Era o terror da molecada da rua, pois era a única que aplicava aquelas injeções que doía até a alma. Quando algum curumim ficava doente os pais tinham de amarrar o caboquinho e levá-lo até a Dona Rosa. Acho que ela era sádica, pois cumpria um ritual:            colocava álcool num recipiente, tocava fogo para esterilizar as agulhas grandes e grossas e as ampolas de vidro. Depois metia a agulha num vidro, quebrava uma ampola e fazia um teste, escorrendo um pouco do líquido, aquilo era cruel para a meninada. Olhava por cima dos óculos e com uma voz rouca                                    dava                           as                      ordens            aos        pais:

- Tira a calça dele, a injeção vai ser na bunda, não quero               que     se     mexa     e      muito   menos  choro, senão aplico outra! 

Meu Deus! Pense num sufoco! O pai segurava o moleque pela cabeça e a mãe pelas pernas. Ela ainda ria,   chamando  o  guri   de   frouxo!

        A mulher era durona, não gostava de ninguém, muito menos de crianças barulhentas. Mas, próximo ao Natal, o seu coração amolecia, mudava de feição, ficava mais alegre, não aplicava as malditas injeções e, pasmem, fazia chocolate quente com biscoitos, convidava todas as crianças para lancharem em sua casa. Mudava da água para o vinho. Fazia uma lapinha e pedia para a molecadarezarem ao redor.

Depois do Natal a Dona Rosa voltava ao oficio de aplicar           injeções doloridas e fazer chorar um monte de crianças da nossa rua!