Por Jose Rocha
Este
prédio histórico, conhecido pelos manauaras como “O Patinho Feio do Centro”
devido ao seu atual estado de abandono, está localizado bem em frente à Praça
Adalberto Valle, na Rua Marquês de Santa Cruz. Uma de suas faces dá para a Rua
Miranda Leão, e a outra para a Avenida Floriano Peixoto, em direção à Rua dos
Andradas.
Segundo
historiadores, no local existia originalmente o Banco de Manáos, que funcionou
até 1910. Após o encerramento das atividades, o imóvel foi adquirido por um
comerciante apelidado de Tico-Tico, que ali abriu uma loja com seu próprio
nome. Ao lado, funcionava a famosa loja Malária Guerra. Os dois empresários, no
entanto, viviam em constante atrito, o que culminou em um trágico incêndio
supostamente provocado por Tico-Tico. O fogo destruiu ambas as construções,
restando apenas ruínas.
A
loja Malária Guerra, localizada na Rua Miranda Leão, foi posteriormente
reconstruída por seu proprietário, um comerciante sírio. Após sua morte, a
viúva, Dona Fátima Alen, assumiu o comando, seguido pela filha, Graça Alen, que
continua à frente da loja até os dias atuais.
Já
em meados da década de 1930, o português Hermano Amado Batista, conhecido na
cidade pelo apelido de “Tartaruga”, adquiriu o terreno onde estavam as ruínas
das lojas incendiadas. No local, construiu um prédio de estilo Art Déco, com
térreo destinado a lojas comerciais e três andares com apartamentos para
aluguel — muitos ocupados por membros das comunidades sírio-libanesa e
portuguesa. O edifício também abrigou consultórios médicos, a sede do PSB, o
curso General Osório, entre outros. Sua inauguração ocorreu em 1946, e, devido
ao apelido do proprietário, passou a ser chamado até hoje de Edifício
Tartaruga.
No
térreo, funcionava uma filial da Loja Cearense, famosa pela venda de tecidos.
Mas o espaço mais emblemático foi, sem dúvida, o Bar Jangadeiro, em atividade
desde 1954, fundado pelo português Alfredo e depois assumido por seu filho
João. Mesmo após o falecimento deste, o bar continuou funcionando sob nova
administração. Frequentava o local nos velhos tempos para saborear um sanduíche
de leitão com cerveja, enquanto ouvia a banda Amigos do Som, comandada pelo
delegado Mariolino. Hoje, ainda passo por lá ocasionalmente aos domingos, para
tomar uma cerveja com os amigos e ouvir um bom samba.
O
nome “Tartaruga” sempre despertou a curiosidade de manauaras e turistas, que
tentavam encontrar alguma semelhança entre o prédio e o quelônio — outrora
muito comum e consumido na região. Mas a verdade é que o apelido nada tem a ver
com o formato do edifício, sendo apenas o cognome do antigo proprietário.
Em
1963, durante o segundo mandato do governador Plínio Ramos Coelho, foi enviada
uma mensagem à Assembleia Legislativa do Amazonas propondo a compra do prédio
por 60 milhões de cruzeiros, para abrigar repartições públicas estaduais.
Apesar da resistência da oposição — que alegava que o governo gastaria o mesmo
valor na reforma e que seria mais sensato usar o prédio em construção na Praça
da Saudade —, a proposta foi aprovada.
Durante
décadas, o edifício sediou diversos órgãos públicos, como: Celetramazon,
SEPLAN, EMATER, CANTEL, SUHAB, Tribunal de Contas, Junta de Conciliação,
Secretaria de Aviação e Obras, SESAU, Defensoria Pública, além da Liga dos
Radioamadores, que ocupava um espaço cedido. A única vez que entrei no prédio
foi para resolver uma questão familiar na Defensoria Pública.
Em
2012, um incêndio agravou ainda mais o estado de conservação do imóvel. Hoje, o
Edifício Tartaruga encontra-se em situação crítica de degradação, tanto interna
quanto externa, sem condições adequadas de uso — o que afeta também os poucos
comércios ainda existentes no térreo.
Em
2024, a estudante Aline Ariele da Silva Beleza, da Universidade Federal do
Amazonas (UFAM), apresentou um excelente Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)
propondo a requalificação do Edifício Tartaruga como um espaço de Hospedagem
Social. O projeto está disponível para consulta no repositório da universidade:
https://riu.ufam.edu.br/handle/prefix/8120
Acredito
que esse trabalho da aluna tenha sido entregue ao Governo do Estado do
Amazonas, mas, até o momento, nenhuma iniciativa concreta foi tomada. Isso é
extremamente lamentável, considerando que o Edifício Tartaruga é um patrimônio
cultural de grande valor histórico e simbólico para a cidade de Manaus. Seu
restauro representaria não apenas a preservação da memória urbana, mas também
uma revitalização importante para a região central da capital amazonense.
Observação:
Amanhã, passarei por lá para tirar algumas fotografias.