sábado, 11 de outubro de 2025

Edifício Tartaruga

 Por Jose Rocha

Este prédio histórico, conhecido pelos manauaras como “O Patinho Feio do Centro” devido ao seu atual estado de abandono, está localizado bem em frente à Praça Adalberto Valle, na Rua Marquês de Santa Cruz. Uma de suas faces dá para a Rua Miranda Leão, e a outra para a Avenida Floriano Peixoto, em direção à Rua dos Andradas.

Segundo historiadores, no local existia originalmente o Banco de Manáos, que funcionou até 1910. Após o encerramento das atividades, o imóvel foi adquirido por um comerciante apelidado de Tico-Tico, que ali abriu uma loja com seu próprio nome. Ao lado, funcionava a famosa loja Malária Guerra. Os dois empresários, no entanto, viviam em constante atrito, o que culminou em um trágico incêndio supostamente provocado por Tico-Tico. O fogo destruiu ambas as construções, restando apenas ruínas.

A loja Malária Guerra, localizada na Rua Miranda Leão, foi posteriormente reconstruída por seu proprietário, um comerciante sírio. Após sua morte, a viúva, Dona Fátima Alen, assumiu o comando, seguido pela filha, Graça Alen, que continua à frente da loja até os dias atuais.

Já em meados da década de 1930, o português Hermano Amado Batista, conhecido na cidade pelo apelido de “Tartaruga”, adquiriu o terreno onde estavam as ruínas das lojas incendiadas. No local, construiu um prédio de estilo Art Déco, com térreo destinado a lojas comerciais e três andares com apartamentos para aluguel — muitos ocupados por membros das comunidades sírio-libanesa e portuguesa. O edifício também abrigou consultórios médicos, a sede do PSB, o curso General Osório, entre outros. Sua inauguração ocorreu em 1946, e, devido ao apelido do proprietário, passou a ser chamado até hoje de Edifício Tartaruga.

No térreo, funcionava uma filial da Loja Cearense, famosa pela venda de tecidos. Mas o espaço mais emblemático foi, sem dúvida, o Bar Jangadeiro, em atividade desde 1954, fundado pelo português Alfredo e depois assumido por seu filho João. Mesmo após o falecimento deste, o bar continuou funcionando sob nova administração. Frequentava o local nos velhos tempos para saborear um sanduíche de leitão com cerveja, enquanto ouvia a banda Amigos do Som, comandada pelo delegado Mariolino. Hoje, ainda passo por lá ocasionalmente aos domingos, para tomar uma cerveja com os amigos e ouvir um bom samba.

O nome “Tartaruga” sempre despertou a curiosidade de manauaras e turistas, que tentavam encontrar alguma semelhança entre o prédio e o quelônio — outrora muito comum e consumido na região. Mas a verdade é que o apelido nada tem a ver com o formato do edifício, sendo apenas o cognome do antigo proprietário.

Em 1963, durante o segundo mandato do governador Plínio Ramos Coelho, foi enviada uma mensagem à Assembleia Legislativa do Amazonas propondo a compra do prédio por 60 milhões de cruzeiros, para abrigar repartições públicas estaduais. Apesar da resistência da oposição — que alegava que o governo gastaria o mesmo valor na reforma e que seria mais sensato usar o prédio em construção na Praça da Saudade —, a proposta foi aprovada.

Durante décadas, o edifício sediou diversos órgãos públicos, como: Celetramazon, SEPLAN, EMATER, CANTEL, SUHAB, Tribunal de Contas, Junta de Conciliação, Secretaria de Aviação e Obras, SESAU, Defensoria Pública, além da Liga dos Radioamadores, que ocupava um espaço cedido. A única vez que entrei no prédio foi para resolver uma questão familiar na Defensoria Pública.

Em 2012, um incêndio agravou ainda mais o estado de conservação do imóvel. Hoje, o Edifício Tartaruga encontra-se em situação crítica de degradação, tanto interna quanto externa, sem condições adequadas de uso — o que afeta também os poucos comércios ainda existentes no térreo.

Em 2024, a estudante Aline Ariele da Silva Beleza, da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), apresentou um excelente Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) propondo a requalificação do Edifício Tartaruga como um espaço de Hospedagem Social. O projeto está disponível para consulta no repositório da universidade:

Descrição: 🔗https://riu.ufam.edu.br/handle/prefix/8120

Acredito que esse trabalho da aluna tenha sido entregue ao Governo do Estado do Amazonas, mas, até o momento, nenhuma iniciativa concreta foi tomada. Isso é extremamente lamentável, considerando que o Edifício Tartaruga é um patrimônio cultural de grande valor histórico e simbólico para a cidade de Manaus. Seu restauro representaria não apenas a preservação da memória urbana, mas também uma revitalização importante para a região central da capital amazonense.

Observação: Amanhã, passarei por lá para tirar algumas fotografias.