Ela era uma típica enfermeira de
antigamente: uma
senhora de idade que ainda trabalhava nos hospitais públicos. Sempre vestida de
branco, gordinha, ranzinza, parecendo estarde mal com o mundo. Mascava um
tabaco de corda. Era o terror da molecada da rua,
pois era a única que aplicava aquelas injeções que doía até a alma. Quando algum
curumim ficava doente os pais tinham de amarrar o caboquinho e levá-lo até a
Dona Rosa. Acho que ela era sádica, pois cumpria um ritual: colocava álcool num recipiente,
tocava fogo para esterilizar as agulhas grandes e grossas e as ampolas de vidro.
Depois metia a agulha num vidro, quebrava uma ampola e fazia um teste,
escorrendo um pouco do líquido, aquilo era cruel para a meninada. Olhava por
cima dos óculos e com uma voz rouca dava as ordens aos pais:
- Tira a calça dele, a injeção vai ser na
bunda, não quero que se
mexa e muito menos choro,
senão aplico outra!
Meu
Deus! Pense num sufoco! O pai segurava o moleque pela cabeça e a mãe pelas
pernas. Ela ainda ria, chamando o guri de frouxo!
A mulher era durona, não gostava de
ninguém, muito menos de crianças barulhentas. Mas, próximo ao Natal, o seu
coração amolecia, mudava de feição, ficava mais alegre, não aplicava as
malditas injeções e, pasmem, fazia chocolate quente com biscoitos, convidava
todas as crianças para lancharem em sua casa. Mudava da água para o vinho. Fazia
uma lapinha e pedia para a molecadarezarem ao redor.
Depois
do Natal a Dona Rosa voltava ao oficio de aplicar injeções doloridas e fazer chorar um
monte de crianças da nossa rua!