Ficava na Avenida Leonardo Malcher, 1141, centro de Manaus, era um casarão da época da “Belle Époque” amazonense, deve ter sido construída no inicio do século passado por um rico seringalista, possuindo um pavimento superior todo em alvenaria com duas entradas laterais e a parte inferior com portas em forma de arcos típico de estrebarias.
O termo Vila (Villa em
latim) era na Roma antiga uma casa de campo (residência campestre). Em todos os
registros de jornais antigos a Villa Martins aparece com dois “l”. Alguns
historiadores relatam que aquela imensa casa pertencia a um seringalista. Nos
mesmos periódicos comentam a existência de um seringal com o mesmo nome, no Rio
Tarauacá, onde é hoje a cidade de Eirunepé, no Amazonas. Presume-se que
pertencia ao mesmo dono, a família Martins.
Guardo boas lembranças
daquele local. Fui morador da Rua Tapajós, que ficava bem próximo a esta Vila,
onde grande parte dos meus colegas da minha adolescência morava ali.
A mais famosa moradora foi a Messody Serruya Israel, que nasceu na Villa Martins. Foi eleita, em 1979, Rainha do Carnaval, representando o Akiko´s Cabelereiros e, posteriormente, Miss Amazonas, pelo Clube Sírio-Libanês.
Em 1980 ela foi trabalhar
na famosa Revista Eficaz, editada pelos fiscais da Secretária de Fazenda. O seu
irmão Abrahão Serruya foi Delegado de Polícia Civil do Amazonas.
Em 1988, o Jornal do Commercio, fez uma reportagem denominada “O Paraíso da Villa Martins”, da jornalista Ana Célia Ossame. Naquela época, moravam 20 famílias muito unidas. Por lá nasceu Francisco Assis de Souza que morava com os seus cinco filhos. Os seus pais chegaram lá em 1926.
As casas eram pequenas,
sem muito conforto, mas era estratégico e ficava no centro da cidade. Os
primeiros quartos na parte superior eram de alvenaria e os restantes de
madeira. Segundo o Senhor
Francisco “A vida era tranquila, ninguém
se incomodava com ninguém, não havia fofocas nem brigas entre os vizinhos. Os
moradores eram tradicionais e permaneciam por muito tempo por lá, moravam
velhos e novos moradores, com alguns pagando até um valor irrisório no aluguel”.
Segundo a mesma
reportagem, em 1988 ainda morava no mesmo local o senhor Moisés Serruya (foto acima),
motorista profissional e o pai da miss Amazonas. Ele gostava de se embalar numa
cadeira na varanda da casa, tinha orgulho de ser o pai da miss que não morava
mais na vila, declarou: “Estou afastado
por problema de saúde, mas aqui é tudo calmo, não sou incomodado pelos vizinhos
e nem pelo barulho das crianças”.
Por lá ainda morava a
Eliana Serrya, que já tinha conseguido uma casa no Conjunto Cidade Nova, mas
tinha um comércio no local, onde vendia alimentos e refrigerantes, pagava dois
mil cruzados pelo aluguel.
Outra moradora
entrevistada pela jornalista foi a Dona Lourdes Santos, que estava morava há 27
anos, declarou: “Estou doente e cansada e
tudo o que se pode falar daqui é que a vida é tranquila”.
Para concluir a
reportagem, a jornalista Ossame escreveu:“Na
grande Manaus, das propagandas oficiais, as vilas, estâncias e moradias sem
condições acabam destoando da Villa Martins, que se livra da especulação
imobiliária que atinge boa parte dos brasileiros. Não é difícil encontrar um
morador que compare a Villa a um paraíso, principalmente pelo preço do aluguel,
dada a localização do imóvel e a
tradição dos moradores”.
Infelizmente, este paraíso
que era a Villa Martins não venceu a fúria devastadora do progresso e foi ao
chão, assim como foram centenas de outros prédios antigos, pois não eram
tombados (protegidos por lei).
Todos os moradores tiveram que sair do local, depois de longos anos vivendo em comunhão. O proprietário vendeu o imóvel para dar lugar a um prédio moderno, abrigando, atualmente, a Escola Superior de Estudos Sociais, da Universidade Estado do Amazonas (UEA).
Os moradores mais antigos,
que ainda moram no entorno, quando alguém comenta com menosprezo sobre a Vila
Martins, rebatem na hora “A Vila Martins é pura história e ali nasceu uma miss do
Amazonas”.
Fonte:
Jornal do Comércio,
edição 13/05/1988 (Hemeroteca Digital Brasileira).
Fotos:
Jornal A Crítica - Jornal do Commercio - José Rocha