sábado, 18 de novembro de 2023

CASARÃO DA RUA FERREIRA PENA 92 ESQUINA COM A RUA MONSENHOR COUTINHO

 

                          Foto: José Rocha


Tempos atrás resolvi tirar fotografias dos frontispícios (em arquitetura é a fachada principal de uma casa ou edifício) de alguns casarões do centro antigo de Manaus, um dos que mais chamou atenção foi do casarão da Rua Ferreira Pena 92 esquina com a Rua Monsenhor Coutinho, um imóvel que está abandonado pelos donos apesar da beleza e singularidade, o que me motivou a conhecer um pouco mais sobre a sua história.

Nas férias de junho deste ano fui até a Igreja de Aparecida e voltei caminhando pela Rua Monsenhor Coutinho, onde encontrei com um vizinho da Rua Tapajós, no trajeto apontei para o imóvel da esquina com a Ferreira Pena e falei que sentia muito por aquele casarão tão bonito estar em estado terminal, ele falou que ali morou a socialite Charufe Nasser.

Horas depois, foi até a Biblioteca do Sesc na Rua Henrique Martins, onde pesquisei e encontrei o livro “A Sultana do Seringal”, da Charufe Nasser, editado em 2006, pela Editora Valer, no qual a autora confirma que morou naquele lugar e escreveu algumas coisas sobre o imóvel.

A Charufe Nasser escreveu que o imóvel pertenceu ao Senhor Verniot, pesquisei na internet, mas nada encontrei a respeito deste cidadão, apenas anúncios de leilões que aconteceram em 1935, publicados pelo Jornal do Commercio, onde foram disponibilizados uma variedade enorme de móveis e utensílios finos importados da Europa, demonstrando que aquele imóvel pertenceu a uma família rica da belle époque.

Geralmente os donos dos imóveis antigos de Manaus mandavam colocar nos frontispícios a data de sua construção, mas este em particular não encontrei nada.

Foto: José Rocha

Além do trabalho de arte na fachada principal, chama muito atenção as grades e portões de ferro, além de um trabalho decorativo na parte externa do alto de todo o segundo andar.

O fausto do ciclo da borracha durou até 1912, quando a riqueza começou a ter o seu fim, provocando uma debandada geral dos estrangeiros, ficando apenas algumas famílias judias, portuguesas e sírias libanesas que ficaram morada neste torrão e os seus descendentes moram até os dias atuais.

A construção das novas moradias não possuíam o mesmo gosto artístico como era no passado, dessa forma, presume-se que este imóvel fora construído no início do século passado.

Descrição da Charufe Nasser em seu livro sobre o imóvel em morou em sua juventude:

“...Aos treze anos de idade, 1959, apareceu uma oportunidade extraordinária: com dez filhos, papai pretendeu se mudar para uma casa maior. O Casarão do Senhor Verniot, na esquina das ruas Ferreira Pena com Monsenhor Coutinho, antigo Consulado da Itália. Os proprietários levaram somente a roupa, pois papai comprou a casa com tudo dentro. Cada um de nós escolheu seu quarto, que já estava prontinho, com cortinas, lustre de cristal, abajures sobre as mesinhas de cabeça, penteadeiras com espelhos franceses, guarda-roupas de madeiras nobres e tudo o mais. O piso, no andar superior, onde ficavam os quartos, eram de tábuas corridas, intercalando-se peças escuras e claras, como no Teatro Amazonas e no Ideal Clube. No andar térreo, logo na entrada, deparávamos com um belo jardim coberto por um caramanchão de buganvilas e, no centro, um chafariz com luzes coloridas. Ao lado do chafariz, havia um enorme pinguim de gesso. Este conjunto era muito bucólico e causava uma impressão diferente. Havia cadeiras de embalos feitas de ferro batido – que temos até hoje – na varanda que dava para o jardim. Ao entrar no salão, que tinha o piso todo de mármore de Carrara. Havia, até uma peça de Lalique e lustres de Murano, vindos de Veneza. Na sala de visitas, ficou meu piano, um Essenfelder que ganhei, aos oito anos idade. Foi uma fase de encantamento descobrir os detalhes da casa, durante a nossa instalação. Era na nossa casa que a juventude se encontrava para dançar, fazer reuniões e bate-papos, organizar projetos culturais, ensaiar danças, como twist, rock and roll, rali-gali, chá-chá-chá, tango e outros ritmos, fazer serestas, saraus, enfim, era, ali, numa casa cheia de jovens alegres, que o melhor acontecia. Lá, aconteciam as mais belas serenatas, as mais elegantes tertúlias, os fartos almoços, as rodadas de pife-pafe. Lá, recebíamos grandes amigos, que ficavam até altas horas, quando saía o jantar sempre com as melhores iguarias. Nós, os jovens, ficávamos entre o pátio e o jardim, batendo papo ou cantando acompanhados pelo piano, executado pelo amigo Elso, ou pelos seresteiros que traziam os violões, cavaquinhos e atabaques. Pela meia-noite, saía um lauto lanche, com coalhada, ovos fritos, sardinhas portuguesas (as enlatadas), azeitonas gregas, que eram saboreadas com pão quente vindo direto do forno lá do “Sujo”, uma padaria limpíssima que ficava em frente ao Rio Negro...”

Olha que relato bonito da Charufe Nasser, da época dos anos dourados dos anos sessenta, dos tempos bons em que as famílias tradicionais de Manaus viviam no centro e se orgulhavam da vida boa em que levavam.

O tempo passou e tudo mudou. Hoje, o centro está esquecido, feio e mal cuidado, mas ainda mantêm várias casas, casarões e até palacetes bem cuidados e, outros, abandonados, como é caso do “Casarão da Ferreira Pena 92 esquina com a Monsenhor Coutinho.

É isso aí.



Foto: José Rocha
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