quarta-feira, 17 de setembro de 2025

ÁRIA RAMOS SUBINDO AO CÉU – AMOR E TRAGÉDIA EM 1915 Trecho do meu livro – José Rocha

 



 

“...Para coroar a vitória do nosso desfile na Avenida Eduardo Ribeiro, o grupo marcou um grande baile na noite da terça-feira Gorda de Carnaval, alugando o Grêmio Recreativo Ideal Clube, sede do antigo Clube Internacional, autorizados pelos diretores Desembargador Franklin Washington de Sá e Almeida e José Lourenço Barroco, pois já haviam comemorado o seu famoso Baile de Carnaval no Sábado Gordo – ficava nos altos de um bonito prédio situado na Rua Henrique Martins, 23, esquina com               a Avenida Eduardo Ribeiro, anos antes de ser transferido para o local definitivo na Avenida Ribeiro com a Rua Monsenhor Coutinho.

 

Cheguei ao Ideal Clube em companhia de meu pai Lourenço Ramos e minhas duas irmãs Celeste e Pátria Ramos, no início da noite, para um jantar requintado, com um bufê composto por uma variedade de pratos que destacavam a influência europeia, especialmente francesa, e ingredientes locais exóticos. Esse banquete servia para demonstrar o poder e a riqueza da elite local, pois, apesar de a decadência começar a aparecer, mostrava o estilo de vida sofisticado e cosmopolita que parte da sociedade ainda possuía.

 

O clube estava rigorosamente decorado para o evento, deslumbrando a todos com a beleza das cores, excedendo a luminosidade das luzes, com lustres de cristal, lâmpadas e luminárias importadas no estilo ‘art nouveau’.  Havia a Sala de Baile bem espaçosa, com pista de dança e palco para os músicos da orquestra. Esses elementos criavam um ambiente de luxo e sofisticação, refletindo a riqueza e a influência cultural europeia na sociedade manauara da época, imperando o requinte e a beleza das damas adornando a coreografia. Tudo era felicidade e harmonia, muitos fantasiados e mascarados, com coros de gargalhadas.

 

Após o banquete, iniciou-se um baile animado pela melhor orquestra da cidade, formada por músicos da Orquestra do Cinema Odeon, da qual eu fazia parte, mas naquele dia eu estava ali apenas para me divertir com os meus familiares e amigos. Esta orquestra era a mais afinada, harmoniosa e com o maior número de figurantes, tocando músicas que estavam mais em evidência, com maior destaque para as ‘Polcas’, uma dança e música de salão originária da Boêmia e modificada no Brasil para o Chorinho.          

 

E por último, a enternecedora, que toca, enternece e sensibiliza, a ‘Valsa’ ‘Subindo ao Céu’, do brasileiro Aristides Manuel Borges, uma música instrumental, sendo uma partitura focada nos arranjos e melodia executada pelos instrumentos musicais - essa me marcou profundamente e foi aquela pela qual serei lembrada por várias gerações de amazonenses.

 

Eu vestia uma túnica de Musa da mitologia grega, longa e volumosa, branca, confeccionada com tecido fino de seda e linho, rendas, ajustada à minha cintura com um fio, criando uma silhueta charmosa, mangas justas até                o cotovelo. Não usava chapéu, um acessório que era essencial para as mulheres da alta sociedade, e com os meus cabelos castanhos soltos, usando uma sapatilha branca amarrada sob uma meia longa, feita sob medida, combinando com o meu traje elegante e sofisticado, um vestuário que era influenciado pelas tendências europeias da época.

 

Como eu era uma pessoa que havia caído no gosto dos Paladinos, sendo a sua estrela maior naquele baile. Por ser considerada de uma beleza estonteante e sendo muito gentil com todos, despertei uma ciumeira entre os fãs apaixonados. Todos olhavam para mim, desejando dançar uma parte e a todos gentilmente atendia, com gestos brandos, maneiras polidas, espírito fino e um sorriso meigo, eu era considerada a estrela maior da festa. Dancei primeiro com o Antônio Craveiro, um amazonense de vinte dois anos, o qual tínhamos pretensões de casamento, após dançarmos sentei à mesa onde estava Mário Travassos, um paraense de dezesseis anos, o que provocou um pouco de ira nele, pois havia entre os dois uma condição de inimizade por desavenças em partidas de jogos de futebol.

 

Neste interim, apareceu na festa um inglês chamado George Fenthon, um gringo dos olhos azuis e cabelos loiros, um pouco mais velho do que eu; ele trabalhava numa empresa inglesa chamada de Manáos Harbour, que administrava o Roadway - ele era muito conhecido e querido pela nata da sociedade manauara. Ficou encantado com a minha beleza, trazendo um copo de água e pediu gentilmente para dançamos, ao qual aceitei de pronto o convite, de repente, parou de dançar e, como eu era de todos conhecido pelos meus dons musicais, fui convidada pelo grupo de amigos que compunha a orquestra para me apresentar com eles, tocando em meu violino a valsa ‘Subindo ao Céu’, talvez um prenúncio de que algo tão terrível iria acontecer comigo em seguida.

 

Após a minha apresentação, voltei à mesa, onde ri e me diverti com outro fã, o Ilydio Barroco, um português da firma Barroco & Cia., quando se aproximou o jovem Mário Travassos, filho do Coronel Antônio R. de Souza, pedindo uma luva que havia esquecido em cima da mesa. Era o final da festa, aproximadamente umas duas horas da manhã de quarta-feira de cinzas, trazendo consigo um momento sinistro, selando o destino cruel da minha vida naquela noite encantadora. Fui atingida pelo disparo de um revólver, vindo do jovem Mário Travassos, que o empunhara de forma estúpida e desequilibrada. Nem todos ouviram aquela detonação, pois achavam que era o estourar de mais um champanhe ou o estampido de lança-perfume quebrado. No entanto, todos se calaram quando ouviram o meu ‘aí’ bem alto. Todos correram e me encontraram curvada sobre a cadeira, com a cabeça apoiada sobre a mesa, além de bastante sangue em meu vestido próximo à minha região pélvica. Houve um pânico, medo e uma correria geral. Meu pai, em choque, correu até a mesa onde eu estava. Colocou as mãos na cabeça, balançando de um lado para o outro, ajoelhou-se e chorou desesperadamente, exclamando: “Meu Deus, o que fizeram com a minha amada filha!” Minhas duas irmãs, em um estado de pânico absoluto, gritavam pelo salão do baile, incapazes de acreditar no horror que estavam presenciando. A cena de desespero da nossa família foi tão intensa que muitas pessoas ao redor começaram a chorar, comovidas pela tragédia que havia se abatido sobre uma pessoa tão querida e amada por todos os presentes na festa....”


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