“...Para coroar a vitória
do nosso desfile na Avenida Eduardo Ribeiro, o grupo marcou um grande baile na
noite da terça-feira Gorda de Carnaval, alugando o Grêmio Recreativo Ideal
Clube, sede do antigo Clube Internacional, autorizados pelos diretores Desembargador
Franklin Washington de Sá e Almeida e José Lourenço Barroco, pois já haviam
comemorado o seu famoso Baile de Carnaval no Sábado Gordo – ficava nos altos de
um bonito prédio situado na Rua Henrique Martins, 23, esquina com a Avenida Eduardo Ribeiro, anos
antes de ser transferido para o local definitivo na Avenida Ribeiro com a Rua
Monsenhor Coutinho.
Cheguei ao Ideal Clube em
companhia de meu pai Lourenço Ramos e minhas duas irmãs Celeste e Pátria Ramos,
no início da noite, para um jantar requintado, com um bufê composto por uma
variedade de pratos que destacavam a influência europeia, especialmente
francesa, e ingredientes locais exóticos. Esse banquete servia para demonstrar
o poder e a riqueza da elite local, pois, apesar de a decadência começar a
aparecer, mostrava o estilo de vida sofisticado e cosmopolita que parte da
sociedade ainda possuía.
O clube estava
rigorosamente decorado para o evento, deslumbrando a todos com a beleza das
cores, excedendo a luminosidade das luzes, com lustres de cristal, lâmpadas e
luminárias importadas no estilo ‘art nouveau’. Havia a Sala de Baile bem espaçosa, com pista
de dança e palco para os músicos da orquestra. Esses elementos criavam um
ambiente de luxo e sofisticação, refletindo a riqueza e a influência cultural
europeia na sociedade manauara da época, imperando o requinte e a beleza das damas adornando a coreografia.
Tudo era felicidade e harmonia, muitos fantasiados e mascarados, com coros de
gargalhadas.
Após o banquete, iniciou-se
um baile animado pela melhor orquestra da cidade, formada por músicos da
Orquestra do Cinema Odeon, da qual eu fazia parte, mas naquele dia eu estava
ali apenas para me divertir com os meus familiares e amigos. Esta orquestra era
a mais afinada, harmoniosa e com o maior número de figurantes, tocando músicas
que estavam mais em evidência, com maior destaque para as ‘Polcas’, uma dança e
música de salão originária da Boêmia e modificada no Brasil para o Chorinho.
E por último, a
enternecedora, que toca, enternece e sensibiliza, a ‘Valsa’ ‘Subindo ao Céu’,
do brasileiro Aristides Manuel Borges, uma música instrumental, sendo uma
partitura focada nos arranjos e melodia executada pelos instrumentos musicais -
essa me marcou profundamente e foi aquela pela qual serei lembrada por várias
gerações de amazonenses.
Eu vestia uma túnica de
Musa da mitologia grega, longa e volumosa, branca, confeccionada com tecido
fino de seda e linho, rendas, ajustada à minha cintura com um fio, criando uma
silhueta charmosa, mangas justas até o cotovelo. Não usava chapéu,
um acessório que era essencial para as mulheres da alta sociedade, e com os
meus cabelos castanhos soltos, usando uma sapatilha branca amarrada sob uma
meia longa, feita sob medida, combinando com o meu traje elegante e
sofisticado, um vestuário que era influenciado pelas tendências europeias da
época.
Como eu era uma pessoa que
havia caído no gosto dos Paladinos, sendo a sua estrela maior naquele baile. Por ser considerada de uma beleza
estonteante e sendo muito gentil com todos, despertei uma ciumeira entre os fãs
apaixonados. Todos olhavam para mim, desejando
dançar uma parte e a todos gentilmente atendia, com gestos brandos, maneiras
polidas, espírito fino e um sorriso meigo, eu era considerada a estrela maior
da festa. Dancei primeiro com o Antônio Craveiro, um amazonense de vinte dois
anos, o qual tínhamos pretensões de casamento, após dançarmos sentei à mesa
onde estava Mário Travassos, um paraense de dezesseis anos, o que provocou um
pouco de ira nele, pois havia entre os dois uma condição de inimizade por
desavenças em partidas de jogos de futebol.
Neste interim, apareceu na festa um inglês chamado
George Fenthon, um gringo dos olhos azuis e cabelos loiros, um pouco mais velho
do que eu; ele trabalhava numa empresa inglesa chamada de Manáos Harbour, que
administrava o Roadway - ele era muito conhecido e querido pela nata da
sociedade manauara. Ficou encantado com a minha beleza, trazendo um copo de
água e pediu gentilmente para dançamos, ao qual aceitei de pronto o convite, de
repente, parou de dançar e, como eu era de todos conhecido pelos meus dons
musicais, fui convidada pelo grupo de amigos que compunha a orquestra para me
apresentar com eles, tocando em meu violino a valsa ‘Subindo ao Céu’, talvez
um prenúncio de que algo tão terrível iria acontecer comigo em seguida.
Após a minha apresentação, voltei à mesa,
onde ri e me diverti com outro fã, o Ilydio Barroco, um português da firma
Barroco & Cia., quando se aproximou o jovem Mário Travassos, filho do
Coronel Antônio R. de Souza,
pedindo uma luva que havia esquecido em cima da mesa. Era o final da festa,
aproximadamente umas duas horas da manhã de quarta-feira de cinzas, trazendo
consigo um momento sinistro, selando o destino cruel da minha vida naquela
noite encantadora. Fui atingida pelo disparo de um revólver, vindo do jovem
Mário Travassos, que o empunhara de forma estúpida e desequilibrada. Nem todos
ouviram aquela detonação, pois achavam que era o
estourar de mais um champanhe ou o estampido de lança-perfume quebrado. No
entanto, todos se calaram quando ouviram o meu ‘aí’ bem alto. Todos correram e
me encontraram curvada sobre a cadeira, com a cabeça apoiada sobre a mesa, além
de bastante sangue em meu vestido próximo à minha região pélvica. Houve um
pânico, medo e uma correria geral. Meu pai, em choque, correu até a mesa onde eu
estava. Colocou as mãos na cabeça, balançando de um lado para o outro,
ajoelhou-se e chorou desesperadamente, exclamando: “Meu Deus, o que fizeram com
a minha amada filha!” Minhas duas irmãs, em um estado de pânico absoluto,
gritavam pelo salão do baile, incapazes de acreditar no horror que estavam
presenciando. A cena de desespero da nossa família foi tão intensa que muitas
pessoas ao redor começaram a chorar, comovidas pela tragédia que havia se
abatido sobre uma pessoa tão querida e amada por todos os presentes na festa....”
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