Conheci o Edmilson quando tinha apenas doze anos de idade, no começo da minha adolescência. Faz muito tempo. Mas, o tempo apesar de muito distante, jamais me esquecerei de um rapaz magrelão e amigão de meu velhão. Lembro muito bem, era no final da década de sessenta. Ele ajudava o meu pai a construir os pilares da nossa humilde casa na Vila Paraíso, entre a Avenida Getúlio Vargas e a Rua Tapajós. Tinha uma garra fora do comum no preparo da massa, em sentar os tijolos, nivelar, fazer o reboco, enfim, fazer o esqueleto de uma casa que seria o único imóvel de seu amigo José Rocha. Um detalhe: trabalhou durantes meses nos finais de semana e até a noite, na construção de nossa casa, sem nada cobrar, tudo em nome da amizade que ele nutria por meu pai. Outros vizinhos ajudavam, incluindo o Zé Maria (um alcoólatra muito querido por todos), mas o Edmilson sempre estava presente, podia fazer sol ou chuva, sem dinheiro, sem comida, sem birita, nada importava, ele queria apenas ajudar o seu amigo Rochinha. O meu pai foi seu amigo e grato até a sua morte. Lembro do pai do Lapinha, um senhor sério, branco e altão, ele tinha uma imensa casa na final da Vila Paraíso. Depois de sua morte deixou para os seus filhos dividirem em partes iguais o terreno, onde moram até hoje. Lembro de sua mãe, uma doce pessoa, durante muitos anos a cumprimentava quando passava por ela. Retribuía com um sorrindo meigo. Fui amigo de suas irmãs e irmãos e filhos. Lembro da Selminha, Bibica, Suely, Sandrinha, Edilson, Toinho e outros. Não lembro o nome de sua saudosa esposa. Depois de muito tempo, fiquei sabendo que o meu pai tinha já tinha amizade com o Edmilson muito tempo antes de ele vir morar na Vila Paraíso. Morava lá no Rua Igarapé de Manaus um senhor que era funcionário público federal, que tinha um apelido de Sêo Peru. Tinha bala na agulha. Ele conseguiu comprar uma casa antiga no Largo de São Sebastião, onde viveu até a sua passagem para o plano superior. Morava próximo a uma loja de material de construção, na qual o Edmilson trabalhava, onde é hoje o Museu da Amazônia. Os dois eram biriteiros, adoravam um rabo-de-saia e o balneário do Parque Dez. Num belo dia, os três se encontraram e formaram um trio da melhor qualidade. O papai tinha outro amigo, o Aldemir, o cara era funcionário da Petrobrás, no entanto era alcoólatra. Ele era apaixonado por uma mulher muito bela que morava na Vila Paraíso, a Eunice. Ela morava na vila do Alcenir, Faraó e Vera. Ela poderia ter tudo do bom e do melhor, mas gostava do Edmilson, apesar de ser casado. Os dois tiverem um filho, acho que é o Toinho, que por sinal é meu amigo. Certa vez, ele levou o meu pai até a Vila Paraíso para conhecer o seu amor platônico. O velho Rocha adorou o lugar. Cá para nós, era realmente um paraíso, com muito verde, árvores frondosas, com um clima de chácara, onde moravam o Boanerges, Sêo Querino & Bahia (avôs do Naninho), Sêo Dorval, Mestre Álvaro (avô do Lula da Nazaré), o pai da Morena e outros. Por lá encontrou o Edmilson, o Sêo Peru, birita e companhia limitada. Naquela época, o dono do pedaço era um cara judeu chamado Abhaim ou coisa parecida, que estava loteado parte detrás da Vila Paraíso. O papai foi incentivado pelo Edmilson a comprar um lote de terra. E assim o fez. Na minha adolescência já partindo para a vida adulta, gostava de frequentar a sede do Luso Sporting Clube, onde eu e os meus irmãos participávamos na contra-regra das Pastorinhas do Luso. Existia um Cão, o diabo mais temido de todos eles, o Belisca Lua, que era interpretado pelo Edmilson. Certa vez, escrevi nas redes sociais que, o Edmilson, o Cão do Luso, foi o único diabo a morar no paraíso, referindo-me a nossa querida Vila Paraíso. Durante esses longos anos sempre tive uma amizade fraterna com ele. Sempre o admirei e o respeitei por ter sido amigo de meu pai. Até hoje não sei por que o chamava de Lapinha e o seu irmão de Lapão. Ambos são varapaus e grandões. Hoje, estou na casinha que era de meu pai e de minha mãe, olhando para os pilares construindo pelo Edmilson, o Lapinha. Infelizmente, Deus o levou na noite de ontem para a sua nova moradia, onde encontrará os velhos amigos que anteciparam a ida, o Rochinha e o Sêo Peru, na Vila Paraíso do Céu. Vai ter festa lá no alto, com muita cerveja de nuvem, é claro!