A rede de dormir foi um invento dos indígenas da América do Sul. No Brasil era conhecida por “Hamaka”, sendo a palavra “rede”, utilizada pela primeira vez, pelo Pero Vaz de Caminha, em carta ao reino de Portugal, onde descrevendo a povoação dos tupiniquins, seus hábitos e costumes, relata a maneira de dormir daqueles indígenas. Faz parte do cotidiano dos manauaras da gema, dos amazonenses e dos amazônidas (aqueles que resolveram morar e viver na Amazônia).
É um hábito muito comum
nas regiões norte e nordeste, faz parte da nossa cultura . Uma grande maioria
das pessoas ainda utiliza a rede em substituição à cama de dormir, além de
servir de descanso nas casas de veraneio.
Originalmente, era feita
de cipó e lianas (trepadeiras que pendem das árvores). No Brasil colônia, era
utilizada também para enterrar os mortos no meio rural, além de servir como
meio de transporte, onde os escravos carregavam os colonos em passeios pela
cidade.
As mulheres dos colonos
portuguesas adaptaram as técnicas indígenas às suas varandas, passando a
confeccionar as redes em algodão e enfeitando com franjas.
Existem muitos causos,
tendo como personagem principal a rede de dormir, eis algumas:
Na minha adolescência, era
comum entre a rapaziada de Manaus, o desejo de conhecer o Rio de Janeiro. Quando
alguém conseguia viajar pela primeira vez de avião, existia sempre aquela
gozação: - Não adianta
levar a rede, pois no avião não existe armador!
A nossa família era
constituída pelo papai, mamãe, vovó, duas irmãs e três irmãos, com exceção dos
meus pais, que utilizam a cama de casal, todos os outros usavam a rede de
dormir, deixei de usá-la somente quando casei, após a separação, voltei para a
minha querida rede de dormir!
Lembro, quando criança, os
mais velhos falavam: – Além da mulher, a
coisa melhor do mundo é a zoada da chuva no telhado de zinco, se embalar e
coçar a frieira no punho da rede!
Tive um vizinho no
Conjunto dos Jornalistas que, certo dia, me revelou: – Ainda não deixei o
hábito de usar a rede de dormir, mesmo após o casamento ato a dita cuja bem
cima da cama da mulher, desço somente para ir ao banheiro urinar ou dar uma
“lamparinada” na velha, depois, subo para dormir!
Eu tinha um amigo morador
da Vila de Paricatuba, município de Iranduba. Ele possuia um belo terreno no
Lago de Paricá, e inspirado pelos
“Bumbódromos e Sambódromos” da vida, resolveu fazer um “Redódromo”: um barracão
com duzentas redes enfileiradas, para servir de pousada para os turistas
mochileiros.
O caboclo preguiçoso
estava se embalando, quando uma grande cobra começa a deslizar pela rede,
morrendo de medo, bota a boca no trombone: - Mãe, a senhora tem remédio para
picada de cobra? A velha responde:
- Tem não, meu filho, por quê? Ele responde naquela
manha: - É que tem uma no punho da minha rede! - preferindo ser picado, ao sair
da sua rede!
Um barco regional ao
chegar ao seu destino, todos os passageiros saíram, ficou somente um
dorminhoco, o Comandante foi até ele e começou a balançar a rede do caboclo: -
Acorda, acorda, acorda! O cara meio sonolento deu um pulo e falou: - A corda é
minha a rede eu não sei de quem é! O ladrão de rede se saiu muito bem!
Na Amazônia as estradas
são os rios. Para vencer qualquer lugar são utilizados os “Barcos Regionais”,
dotados de alguns “Camarotes” para os mais abastados, sendo que a grande
maioria utiliza-se das redes de dormir, ficam atadas e amaradas pelos lados,
por cima e por baixo, ficando sem espaços até para mexer as pernas!
Sempre gosto de ir ao
Festival de Parintins, não tem coisa melhor do que ficar se embalando numa rede
e olhando o Rio Amazonas. Por
falar em festival, em 2011, a última vez em que fui a Ilha Bela, passei o maior
mico, o jornalista Jersey Nazareno presenciou a cena, ela publicou no Blog da
Floresta:
O
"caboco" respeitável do Igarapé de Manaus que não sabe atar rede
No sufoco de cobrir
matéria para o “BLOGDAFLORESTA”, hoje, no Porto da Manaus Moderna, escuto
alguém dizer “vamos nessa”. Era
“Caboco Rochinha” a caminho do barco que o levaria ao Festival de Parintins.
Não titubeei e, segui o Rochinha até o motor-navio catamarã ”Rondônia”. Subimos
juntos para o andar de cima, onde ele ataria sua rede. Meu espanto!
"Caboco Rochinha", que se criou rincando nas águas, ainda, não
poluídas do Igarapé de Manaus, teve dificuldades para atar sua rede, porque não
sabia dá o nó certo, como a grande maioria dos que nos barcos, singram os rios
amazônicos e ao parque daqueles que vão ao Festival de Parintins. Ele teve que
pedir ajuda de outro passageiro que atou a rede como mandava o figuro regional,
enquanto ele observava. Olhou pra mim, sorriu, e deixou escapar: “agora eu sei
que o nó não desata”. Saímos e fomos comer um bom jaraqui nas redondezas do
mercado Adolpho Lisboa. Vale lembrar que o "caboco" que não sabe atar
rede, sabe fazer outras coisas importantes, como por exemplo, colaborar com uma
das maiores lojas de Manaus (Mirai Panasonic) e alguém que melhor entende de
comércio exterior na Zona Franca de Manaus. (Jersey Nazareno)
Depois dessa, comecei a
exercitar o nó no punho da rede, com certeza, não irei fazer feio na viagem de
barco para o próximo festival de Parintins.
O cantor e compositor
paraense Nicolas Junior, com mais de duas décadas morando e trabalhando em
Manaus, gravou o seu 5º CD temático, em 2013, denominado “Mãos”. Uma das faixas
que mais me chamou a atenção foi “Redes Sociais”. Segundo o artista foi em
homenagem “As mãos caboclas que constroem, diariamente, nossa sociedade,
tanto da capital quanto do interior”.
Um trecho da letra é mais
ou menos assim:
Peguei um motor de recreio
Viajei para o interior
Fui que nem sardinha em
lata
Na rede
Para rever a família
Rede por cima
Rede por baixo
Rede de lado
E no corredor
Era um transado de rede
Bolsa, maleta, sacola no
chão
Sou caboco pavulagem
Só dormia em colchão
Foi quando descobri, então
Eu adoro rede
Eu adoro rede, maninha....
É
viva a rede! É isso ai!