sábado, 6 de abril de 2024

*O BRANCO & O ZÉ MUNDÃO DE MANAUS*

 


*Por José Rocha*

 

Este relato faz parte do meu livro 'Vila Paraíso', ainda em prelo, que espero um dia publicar.

Meu vizinho Damião, mais conhecido como Branco, partiu para o andar de cima ontem. A tristeza tomou conta dos moradores da Vila Paraíso, pois ele era uma pessoa boa e muito amada por todos. Era alguém que realmente fazia a diferença. Em vez de chorar pela perda do meu amigo, escolhi contar uma história que vivi com o Branco na nossa juventude, uma forma de homenageá-lo com sorrisos, não lágrimas.

"A turma do Zé Mundão, que incluía o Damião Branco, Bola, Bira, Getúlio e Faraó, era o coração do carnaval. Eles eram parte do bloco Unidos da Getúlio Vargas, onde o Zé tentava comandar o espetáculo, mas o Mestre Bola, um negão de puro samba no pé e uma barriga que precedia sua fama, não deixava por menos. 'Zé Mundão, para de bagunçar o samba, senão vou te ensinar a dançar com uns bons sopapos!' Mas o Zé, escorregadio que só, retrucava: 'Tudo bem, mas se eu sair, levo a cerveja do Bira e a turma toda comigo!' Diante dessa ameaça, o Mestre Bola dava uma aliviada.

No dia do desfile na Avenida Eduardo Ribeiro, o Zé só encontrava o ritmo após embalar-se com o conhaque 'Padrinho Acrísio', uma bebida tão potente que fazia o guaraná Baré parecer água.

O Zé e seu Fusquinha '75, apelidado de 'Suado', eram figuras conhecidas nos recantos mais peculiares da cidade, mas só se aventuravam quando o dinheiro permitia, pois o Zé era conhecido por segurar cada centavo.

Numa noite, ele e o Branco decidiram ir ao bordel, mesmo sem um tostão no bolso, mas a sorte lhes sorriu com um achado inesperado: um maço de dinheiro no chão do banheiro do Posto Cinco. Com os bolsos recheados, rumaram para o Piscina Club, onde o Zé se transformou em um seringalista da Belle époque, esbanjando cerveja e churrasco como se fosse seu último carnaval.

No bordel, o Zé e o Branco foram cortejados por duas 'donzelas', que logo perceberam que o Zé estava 'armado' financeiramente e começaram a pedir luxos e mimos. Uma delas sugeriu que fossem para a casa dela, prometendo um ambiente mais confortável. E assim fizeram: os quatro embarcaram no 'Suado' e seguiram para a Rua da Cachoeira, no bairro de São Jorge, um local mais tranquilo e abençoado que o altar de uma igreja.

Antes de partirem, o Branco sugeriu ao Zé esconder metade do dinheiro sob o tapete do carro, desconfiados da índole das moças. Num momento de lucidez, o Zé concordou com o conselho do amigo leal.

Ao chegarem, perceberam que a casa era muito pior que os quartos do bordel. Mas o que importava era aproveitar a companhia das moças e gastar o dinheiro que não era deles.

A festa foi interrompida abruptamente quando alguém bateu na porta com força. A 'princesa' do Zé alertou: 'É meu marido, e ele é perigoso! Fujam pelo quintal, peguem o carro e sumam daqui antes que ele os encontre!'

Os dois amigos escaparam por um triz e, ao conferirem os bolsos, perceberam que todo o dinheiro havia desaparecido. Então se lembraram do conselho do Branco: a outra metade do dinheiro estava segura sob o tapete do Fusca. Com os bolsos novamente cheios, eles tinham agora uma história incrível para contar por muitos anos nos bares da Vila Paraíso.

Voltando ao presente, imagino que o Branco esteja rindo lá de cima dessas aventuras que estou compartilhando. Um abraço, meu amigo Branco, e obrigado pelos bons momentos que compartilhamos aqui na Terra. Conte essas histórias aí no céu para os malucos da Vila Paraíso que se foram antes de você, incluindo o Lapinha, Taca, Nascimento, Deusa, Rocha do Violão, Seu Quirino, Dona Baia, Walder, Boa, Mestre Álvaro, Ulisses Doido, Durval, Graça e tantos outros."