Por José Rocha
Era a segunda metade da
década de sessenta, lembro muito bem, tinha somente doze anos de idade, quando
fui morar na Vila Paraíso, bem próximo a Rua Tapajós. Por ser um adolescente
consciente, os meus pais me permitiam caminhar sozinho e, conhecer uma parte de
minha cidade que nunca dantes tinha visto em minha vida. Tudo era grande,
enorme, bonito e cheio de esplendor. A minha preferência era jogar bola na
quadra do IEA, pois, segundo os mais velhos bastava subir um enorme muro e
"brechar" muitas mulheres peladas que eram internas no Benjamin
Constant. Eu ficava excitado, doidinho para subir aquela muralha e ver “in
loco” mulheres “peladinhas da silva” tomando banho. Certa vez, os adultos conseguiram
uma escada longa de madeira e falaram que a prioridade era para os
adolescentes, fui na corda dos malandros, subi e comecei a olhar pelo telhado
e, nada de mulher nuazinha, quando resolvi descer, os camaradas tinham
escondido a escada. Caralho! E agora, José? Os leprosos ficavam rindo da nossa
cara de otários. Pense numa fuleiragem. O jeito foi andar feito equilibrista
pelo telhado até chegar nos fundos do IEA, onde o muro era mais baixo e descer
com o coração a mil batidas por minutos. Ai, ai, ai, ai, ai! Fui transferido do
Colégio Barão do Rio Branco e a minha mãezinha me matriculou no Colégio Divina
Providência, na Travessa Frei Lourenço, onde ficava divagando e olhando o
Palacete Miranda Corrêa (demolido em 1971), em decorrência de minha genitora
ter um dia falado que o meu avô, um carpinteiro dos bons, fora contratado para
fazer as janelas daquela residência, eu nada entendia de marcenaria, mas,
dentro de minha sala de aula no segundo andar, ficava imaginando o meu avô
trabalhando naquele prédio, viajei tanto em meus pensamentos que fui reprovado.
Naquela época, o Prédio da Saúde, onde é hoje uma Agência dos Correios, estava
fechada e abandonada, um prato creio para jogar pedras e quebrar as janelas de
vidros, era uma loucura, não tinha noção de nada, apenas queria me divertir e
nada mais, jamais iria imaginar que muitos anos depois seria um ferrenho
defensor da preservação dos prédios antigos. Lembro, também, que eu ficava
junto com uma galera olhando os aniversários dos filhos dos bacanas no Ideal
Clube, certa vez, uma dondoca abriu a porteira e mandou toda a moleca de rua
entrar e participar da festa. Meu Deus! Foi uma loucura, eu comia feito um
desgraçado e colocava os salgados e docinhos nos bolsos e até dentro da cueca.
Coisa de pobre, né? Ao lado do Ideal Clube, morava um mega empresário, o Isaac
Benayon, um camarada riquíssimo que gostava de abrir a sua mansão, permitindo
aos jovens e adolescentes pobres da redondeza adentrarem e lancharem numa boa,
tudo do bom e do melhor, lembro dele, em sua calma e paciência, com um leve
sorriso ficava olhando a garotada se empanturrar de tantas guloseimas. O tempo
passou, estudei no Benjamin e no IEA, frequentava a Sorveteria Pinguim, depois,
fui estudar na Faculdade de Estudos Sócias da antiga UA, na Rua Monsenhor
Coutinho e também no CAUA, da Rua Tapajós. Bebia na Choperia do Pinguim e
namorava com as gatinhas da Praça do Congresso, ficava olhando um espigão que
tomou o lugar do Palacete Miranda Corrêa e um prédio feio “Correios” que fincou
lugar no lugar da “Saúde”. Gostava de olhar a residência do Doutro Arlindo
Frota, um amigo do peito de meu pai Rochinha. Atualmente, passo por lá todos os
dias, mas nada mais toca o meu coração, apenas ficou as memórias de um passado
distante. É isso ai.