NASCENTE DO IGARAPÉ DE MANAUS
Fiz um trabalho de campo para descobrir, realmente, onde estão as principais nascentes do Igarapé de Manaus. Por incrível que pareça, poucas pessoas sabem onde elas estão localizadas: fica numa baixada da Avenida Barcelos, nas proximidades do antigo Cine Popular. Muitas pessoas falavam que ficava por detrás da TV Encontro das Águas (antiga TV Cultura do Amazonas). No local encontrei um imenso bueiro, construído quando do aterro da baixada da Rua Nhamundá. Segundo moradores, aquela nascente foi praticamente aterrada.
Conversei com os mais antigos da Avenida Barcelos. Dentre eles, tive a grata surpresa de reencontrar o Jackson Figueiredo, primo-irmão do Adelson e Aldenor Figueiredo Brito, meus contemporâneos da Rua Igarapé de Manaus.
O Jackson fez a indicação exata da nascente: o acesso é feito através de dois becos, onde é possível verificar in loco a água brotando da terra. Segundo ele, o professor da antiga Universidade do Amazonas, atual UFAM, Carlos Dias, conhecido por “Carlão”, fez um trabalho no local para a universidade na década de setenta, constando de entrevistas com os moradores do entorno, filmagens e fotografias, onde é possível mostrar toda a exuberância do lugar naquela época, com a mata ciliar preservada, pessoas tomando banhos, com muitos peixes aparecendo ao fundo das águas límpidas e cristalinas. Não pude resgatar esse material, pois o ilustre professor está aposentado e resolveu fixar residência na capital federal, em Brasília.
No local existe uma área de mata primária protegida pela mãe natureza, com um morro que dá acesso pela Avenida Airão, na Praça Chile. Ele é um grande paredão com cem metros de altura, de difícil acesso, o que não permitiu a invasão e a construção de casas que impactariam, com certeza, as nascentes.
No início da Avenida Barcelos existe um prédio antigo, datado de 1909, onde funcionava o Cine Popular, conhecido por Cine Poeira. Esporadicamente, ia assistir a filmes nas tardes de domingo. Na minha infância, lembro que aquela baixada era chamada de “Covão” (uma grande cova), onde eram feitos descartes de lixo pelos moradores do entorno. Frequentava aquele lugar naquela época, pois ali morava um grande amigo do meu pai, o Abdias Bodó (um dos personagens deste livro). Jamais iria imaginar que, um dia, voltaria ao mesmo ambiente e constatar que ali era a nascente do igarapé onde passei a minha infância/adolescência.
Na realidade, existem duas grandes nascentes, dentro de terrenos de particulares. Numa delas, a moradora não me deixou adentrar. Na outra, não fui bem recebido pelo dono da área.
Fiquei sabendo que o local consta dos planos do Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus, mais conhecido como PROSAMIM, onde planeja indenizar todos os moradores, tirá-los do local e construir blocos de apartamentos e uma grande praça na nascente, que seria a “Praça da Nascente do Igarapé de Manaus”. Estes moradores não querem sair do local e hostilizam as pessoas que procuram informações sobre a área. O governo do Estado do Amazonas homologou uma licitação para certa empresa especializada em executar estudos, projetos, serviços de campo e relatórios de licenciamento arqueológico de toda aquela área.
Foto: Marco Gomes
Voltei outra vez ao local, em companhia do escritor, poeta e fotógrafo Marco Gomes; do cinegrafista da TV Encontro das Águas, o Zé Carlos “Cartier” (morador antigo da área, lado esquerdo da foto); outro morador que fez questão de nos acompanhar (ao lado direito da foto) e da Ivete Bruce (não aparece na foto), serviu como guia, ela foi minha colega de trabalho na antiga “Lojas Populares”, de Braga & Cia em tempos idos. Adentramos em uma das nascentes, onde foi possível recolher água de uma cacimba alimentada pelas águas cristalinas da nascente. Apesar de existirem fossas biológicas no local, a nascente é monitorada pelos técnicos do IPAAM, segundo os moradores.
O registro fotográfico acima, de excelente qualidade, foi feito pelo saudoso Marco Gomes (faleceu meses depois), onde eu apareço coletando a água diretamente da fonte (cacimba), ladeado pelos moradores acima citados. Guardo essa água dentro de uma garrafinha plástica, onde poderei mostrar a outras pessoas quando da apresentação deste livro e ficará como lembrança daquele momento sublime.
Em companhia da guia Ivete Bruce foi possível entrarmos pelos Becos Belém e Barcelos, percorrendo todo o caminho das águas, desde a nascente até a Rua Japurá, após que percorremos a Praça Nestor Nascimento, onde as águas do igarapé passam canalizadas.
Segundo os moradores antigos, naquele local era conhecido como “Cacimbal”, onde existia uma grande quantidade de cacimbas (buracos onde flora águas subterrâneas). Pude confirmar, no local, a existência de algumas cacimbas, confirmando a hipótese de que o Igarapé de Manaus possui duas grandes nascentes e inúmeras outras cacimbas pelo caminho até encontrar o Rio Negro.
Quem observar atentamente a topografia onde passa o Igarapé de Manaus, desde a sua nascente até a sua desembocadura no Rio Negro e também ver o mapa de 1906 (Anuário de Manaus 1913-1914), poderá verificar que naquela área existe uma grande depressão natural (baixada), onde, no passado, as águas invadiam toda a sua extensão quando da cheia dos rios.
Com o passar dos anos foram feitos vários aterros ligando as margens da Avenida Joaquim Nabuco com a Rua Major Gabriel (antiga Rua Tomás Pinto). Entre as ruas Barcelos e a Nhamundá é possível verificar um pequeno córrego (protegidos por matas ciliares), com as águas advindas da nascente, chamado antigamente de “Cacimbal”, a partir da qual ele entra nas tubulações.
A baixada da Rua Japurá apelidada de “Buracão”, o “PROSAMIM” construiu a Praça Nestor Nascimento (ele foi meu amigo e do meu pai) com as águas da nascente passando pelas tubulações.
Na descida da Avenida Tarumã, inicia-se o conjunto de apartamentos “Parque Residencial Manaus”, interligando com a Rua Dr. Machado.
No aterro da Avenida Leonardo Malcher a mãe natureza não perdoou: havia um afundamento constante da pista. Em junho de 1993 houve um grande desabamento do aterro, arrastando varias casas. Neste local foi construída a “Ponte Isaac Sabbá” (em homenagem a um dos homens mais importante da historia do desenvolvimento do Amazonas). Por debaixo da qual existe a continuação do conjunto de apartamentos.
Seguindo na Avenida Ramos Ferreira existe uma depressão natural, antigamente era conhecido como “Buraco do Pinto” por ficar próxima a Rua Tomás Pinto (Capitão Manuel Tomás Pinto Ribeiro, filho do Major Gabriel). Em 1957 o governador Plínio Ramos Coelho determinou o aterro definitivo. Neste local inicia-se a segunda etapa do conjunto de apartamentos do “Parque Residencial Manaus”.
Foto: Jornal do Commercio
Rua Ipixuna – o aterro para construção do logradouro deu-se em 1956, conforme fotografia acima do “Jornal do Commercio” daquela época.
Rua Igarapé de Manaus – na cheia do Rio Negro, invadia toda aquela área, atualmente, abriga o Parque Desembargador Paulo Jacob, onde passa uma pequena lâmina de água na vazante.
Avenida Sete de Setembro – passa a Ponte Romana I (também conhecida como Primeira Ponte) – na cheia do Rio Negro uma parte do rio teima invadir o que foi aterrado, conforme podem verificar na fotografia abaixo, clicada por mim no meio da ponte.
Foto: José Rocha (Igarapé de Manaus)
Foto: José Rocha (Encontro do Igarapé de Manaus e Igarapé do Bittencourt)
Parque Senador Jefferson Péres – onde o Igarapé de Manaus se encontra com o Igarapé do Bittencourt (foto acima), percorrendo desde a nascente, três quilômetros, passando por debaixo da Avenida Lourenço Braga (conhecida como “Manaus Moderna”, local onde o governador do Amazonas aterrou a entrada do Rio Negro) até desaguar na foz do “Igarapé do Quarenta” e do “Mestre Chico”, na margem esquerda do majestoso Rio Negro (foto abaixo), seguindo até Rio Solimões, formando o grandioso Rio Amazonas até chegar ao Oceano Atlântico. As fontes do nosso Igarapé de Manaus, apesar de ser apenas uma gota no oceano, contribuem e ainda hão de contribuir para a imensidão do mar!
Trechos do Livro EBook "O Igarape de Manaus, José Rocha"
Foto: José Rocha (Desembocadura do Igarapé de Manaus)